Sonhar Acordado
Sonhar nunca foi proibido e eu, mesmo acordado, era um sagitariano sonhador. Sonhava ser algumas coisas na vida que nunca se concretizaram, como por exemplo queria ser médico, mas logo ai pelos meus 11 anos, vi que era impossível tornar isto realidade.
Dirão vocês, que ousadia o filho de um ferroviário da Mogiana ser médico. Naquele 1945 era fora de qualquer lógica. Eu explico o porque desta paixão: Eu tinha ido com minha mãe consultar com um médico para ela, na rua Andrade Neves, devia ser com ordem da Companhia Mogiana. Enquanto esperávamos a vez de consultar, chegou uma mulher com uma criança no colo e disse à secretária do médico que seu filho estava muito doente, e queria que o doutor visse a criança e desse algum remédio, que ela pagaria lavando as roupas do consultório e fazendo a limpeza do mesmo quantas vezes fossem necessárias, pois ela não tinha dinheiro algum para a consulta. A secretária disse que o médico era muito ocupado, e somente atenderia às pessoas com consultas marcadas e que ela fosse procurar a Assistência Pública ou o Centro de Saúde, locais muito distantes dali.
Então a mulher, com lágrimas nos olhos, cobriu bem o seu filho pois estava chovendo e, com um velho guarda-chuva, foi embora mas deixou em mim uma semente e ai eu sonhei: Lá estava eu, já adulto, com um modesto consultório, com um pequeno jardim na frente, cheio de cravos e hortências, pois as flores ajudam aqueles que chegam com problemas, e dão um toque de suavidade ao ambiente. Ao lado, uma pequena placa que dizia Dr. L Rossi, muito singela, quem sabe para aproveitar a fama do Dr. Ross, aquele da pílulas, e o mais importante; atendia a todos com ou sem dinheiro e, às terças-feiras das 7 às 13 horas, as consultas eram gratuitas. Se ficaria bem financeiramente, não sei. Só sei que seria muito feliz, fazendo aquilo que gostava, atendendo os mais humildes. Mas foi um sonho que não se realizou.