FOTOS

Nos bairros populosos que se notabilizavam como ponto de atração para os periféricos, havia sempre uma loja com a placa destacando que ali se faziam fotografias.

No bairro ligado ao que eu morava na juventude, havia o FOTO VIEIRA cujo dono, Sr. Vieira (logicamente) era o responsável por fazer a cobertura fotográfica dos casamentos, batizados, formaturas, bailes de 15 anos e demais eventos sociais, além claro, das que seriam usadas nos documentos ou transformadas em cartões postais dos mortais comuns ou dos artistas com relevância na atualidade.

No FOTO VIEIRA, a máquina era daquelas bem antigas, quadradas, feitas de madeira.

O profissional cobria a cabeça com um pano preto e depois de feito o enquadramento acendia os refletores e fotografava acionando o obturador através de um cabo longo e fino.

Para as fotografias de documentos em que eram obrigatórios paletó e gravata, havia paletó azul e a frente de camisa branca com gravata preta ajustada ao colarinho com tiras para amarrar na altura da nuca.

O conjunto era semelhante ao babador de criancinhas que, depois de ajustado sob o paletó, dava a impressão de que o fotografado estava vestido conforme o figurino exigido, apesar do cheiro desagradável de peças muito usadas, mas nunca lavadas.

Salvo nas oportunidades em que a urgência era maior do que torniquete para estancar sangria, nunca menos de uma semana era o tempo que precisávamos esperar para ver as fotografias feitas na loja ou as cópias dos filmes que levávamos para revelar.

Naquele tempo o meu pai teve a máquina Kodak, tipo caixão, que usava filme com 12 poses.

Raramente conseguíamos 8 das 12 fotos.

Longe de mim a ideia de duvidar do profissionalismo ou retidão de caráter do Sr. Vieira, mas será que o seu proceder estava conforme o recomendado pelo fabricante dos filmes?

Com a evolução da tecnologia todo mundo aprendeu a fotografar.

Surgiu até um termo novo, selfies.

Os programas de computador fazem os milagres imaginados pelas mentes mais férteis, emagrecem as “rolhas de poço”, vestem os “tribufus” com artigos de marcas, criam ou ajeitam cabeleiras, tiram manchas da pele, excluem os “papagaios de piratas” indesejados...

As câmeras evoluíram até serem substituídas pelos celulares, a Kodak que fabricava filme e papel fotográfico faliu e as lojas do tipo FOTO VIEIRA deixaram de existir.

Os profissionais, salvo na mídia tradicional, na polícia técnica e para os eventos oficiais da política estão cada vez mais raros assim como os “lambe-lambe” das grandes cidades.

Os álbuns foram substituídos por pen-drives que acoplados à TV, automaticamente, expõem as fotos digitalizadas.

Agora, fotografias obrigatórias para Identidade, CNH, Passaporte, etc. são digitalizadas e a pessoa pode escolher aquela em que está mais “bonitinho” entre as muitas que são feitas na ocasião, e, se a dúvida permanecer, o atendente do Poupa Tempo pode dar uma sugestãozinha em qual delas o sujeito não está semelhante ao “papa figo que assusta lobisomem” como na monstruosa e tragicômica foto 3X4 das antigas CTPS.

CITAÇÕES

CNH = Carteira Nacional de Habilitação

CTPS = Carteira Profissional e Previdência Social

Lambe-lambe = alcunha de fotógrafos ambulantes, motivada pelo hábito de tirar o excesso do produto da revelação com a língua.

Lobisomem = figura mitológica, mistura de homem e lobo.

Papa figo = figura mitológica de homem velho que se alimenta com fígado de crianças.

Papagaio de pirata = gente estranha que aparece nas fotos.

Poupa Tempo = órgão estadual para acesso a todos os serviços públicos num só lugar. Em Pernambuco se chama Rapidinho.

Rolha-de-poço = pessoa volumosa e muito acima do peso ideal.

Selfies = fotografar-se

Tribufu = pessoa malvestida, desalinhada.