Memórias Póstumas de Sábado

Hoje, uma cena no ônibus me fez refletir. Era sábado, 11 horas, e eu seguia para o trabalho, como todos os dias. O mesmo trajeto, o mesmo ônibus.

É. Sábado. 11 horas. E eu, ainda assim, estou indo para o trabalho.

A uma fileira à minha frente, ao lado direito de onde estou sentado, uma senhora com sua neta que aparenta ter seus 10 ou 12 anos de idade, menina inteligente, comunicativa e observadora.

O que me despertou a atenção foi a conversa que estavam tendo:

- "Foi aqui que a senhora veio?" pergunta a menina direcionando o olhar para o cemitério da Saudade, um famoso cemitério aqui da cidade.

- "Sim, foi aqui sim!"

- "Tem muito caixão aí?" indagou a menina curiosa

- "Tem, um pouco..."

A menina interrompe a vó:

- "Mas ali tá escrito velório, porque?"

- "Velório é onde a pessoa fica antes de ser enterrada," respondeu a vó, "para que as pessoas possam se despedir dela."

Nesse momento eu me questionei:

"Um dia a senhora do ônibus vai falecer, será velada e sua neta vai estar com ela em todo o momento fúnebre, mas será que ela irá se lembrar dessa breve conversa que ela teve com sua vó num Sábado, às 11 da manhã, no ônibus?"

Talvez, nesse dia, ela não se lembre do diálogo daquele curto trajeto. Mas, quem sabe, a essência daquela conversa sobreviva de alguma forma — um sentimento, uma lembrança vaga, ou apenas o calor da companhia da avó.

E a vida continua fluindo, e nós: tentamos colecionar momentos que, mesmo passageiros, têm o poder de permanecer de maneira que nunca possamos compreender, ou sim.

E essa lembrança, essa senhora, essa menina curiosa e esperta estão eternizadas em palavras que nunca farão parte de suas lápides.

E embora a conversa tenha continuado até o ponto final, meus pensamentos ficaram presos ao registro daquele momento único. Meu questionamento, talvez, nunca terá respostas — e tudo bem.