Ela varria o corredor quando eu passava para ir ao toalete. Tornou-se rotina vê-la pelos corredores e trocar algumas palavras sobre o tempo, o dia, a temperatura. Mas naquele dia ela me perguntou mais uma vez se eu era professora ali. Respondi que sim, era professora, mas noutro departamento da universidade. Ali eu era apenas uma estudante de pós-doutorado. Ela me perguntou o que era um pós-doutorado. Depois das explicações, confidenciou:

- Sabe, Maria? Eu queria ter um filho doutor! Era meu sonho!

Fiquei meio muda, meio sem saber o que dizer, perguntar, porque ela falou e ficou me olhando com aqueles olhos parecendo tristes... Fiquei com medo de perguntar algo... esperei... Então ela continuou...

- Meu filho mais velho é muito inteligente. Mas não quis mais estudar depois que começou a trabalhar. Parou no ensino médio. Ele é artista. Trabalha com arte. Cria, vende. Vive bem com o que faz, mesmo sem ter estudado. Minha filha do meio nem terminou o ensino médio. Namorou, casou e hoje é dona de casa. Eu sei que ela é feliz, mas queria tanto que ela tivesse estudado mais... Mas ela não quis... Meu filho mais novo parou de estudar mais cedo ainda. Adolescente. Não quer saber de estudar mais. Trabalha e ganha o dinheiro dele. É feliz do jeito dele.

E assim Dona Rosália seguia me contando de seus filhos e do desejo profundo de que um deles tivesse estudado para ser doutor(a).

Então passou um professor/doutor do programa de pós-graduação. Eu disse a ele:

- João, veja, a Dona Rosália tinha o sonho de ter um filho doutor.

Ele parou para conversar e enquanto ela relatava ele refletiu com ela sobre eles serem felizes e fazerem com dedicação e bem feito o que faziam... De serem bons no que faziam, trabalhavam. Da filha ser uma ótima dona de casa e ser feliz como Dona Rosália falou... 

Depois de um tempo de conversa o professor foi embora e ela e eu ficamos ali. Ouvi ela mais um pouco e então compreendi tudo. Ela iniciou a relatar de sua infância, de seu pais, de quando foi na escola e teve de parar de estudar para trabalhar. Eu ouvia compenetrada, prestando muita atenção. De repente ela me disse:

- Sabe, Maria? Quando eu era pequena eu tinha um sonho: eu queria estudar para ser doutora!