DO PERDOAR
Perdoar deixa qualquer alma assanhada, pois exige carga máxima do sangue e do coração. Quem perdoa faz uma miscelânia nos lambirintos da razão como nunca se viu. O perdão desacata Deus e bota todos anjos em debandada. Perdoar é pra quem já abdicou do respirar, tatear, redimir. É fruta de raça rara, de olhos arregalados e andar matreiro. Quem perdoa ecoa cheiros difusos, moleques e arrebatadores. Tem guizos desnudos e músculos desembestados e desamamados. Daquele perdão aflito e ralo, com seus penduricalhos rimados e febris, extraio o melhor de mim, o mais benquisto paladar. Dá gosto perdoar quem desgraçou, estraçalhou cada gota do querer-bem e desfigurou todas rédeas, armaduras e folhetins. Dá gosto perdoar quem nos dizimou, desandou e espezinhou. Dá gosto embeber o perdão no nosso melhor suor, gozo e lágrimas. E o que mais couber nesse chão.