Senhoras das valsas
Edson Gonçalves Ferreira
Toda vez que havia festa na família Ferreira (Bigode), minhas tias Eulina e Luíza, que tocam muito bem violino e liam partitura com exímio, só esperavam a vez de largar os arcos, deixando meus tios Dé, Antenor, João, Rodrigo tocando bandolins, violinos, violões e meu pai, piston, para cair na dança.
Nós, meninos, achávamos engraçados, porque as duas, embora casadas, preferiam dançar uma com a outra e viravam pés-de-valsa. Dançavam até não poder mais. Eu, que ainda era menino, bem pequeno ainda, ouvia deleitado a orquestra da família tocando, observando minhas tias rodopiano quer no quintal de suas casas, na marcenaria de meu pai ou em algum salão.
Tia Eulina já faleceu e, portanto, só me resta, agora, as lembranças dessa mulher fantástica que tanto engrandeceu minha vida com suas lições de vida. Sim, minha avó paterna morreu cedo e, assim, foi Tia Eulina quem criou meu pai. Dessa forma, ela era tia e avó ao mesmo tempo.
Quando eu chegava na casa dela, ficava encantado com as panelinhas que ela usava. Cozinhava para Tio Augusto, para meus primos Toninho, Romilda e Rômulo e para quem chegasse. Nunca entendi como ela fazia o milagre: cozinhar em panelas tão pequenas e ter tanta fartura.
Tia Luíza ainda vive, tem mais de 100 anos e, agora, infelizmente, já não toca mais violino, já não dança e vive, cuidada pelas filhas, numa cama onde, com certeza, sonha com o dia em que poderá, noutra dimensão, encontrar com Tia Eulina e, lá, poderão valsar novamente sob o olhar embevecido de Deus Pai.
Toda vez que passo pela Rua da Bela Vista, hoje chamada de Rua Vicente Ferreira Valério, em homenagem ao meu primo já falecido, perto do local onde ficava a casa do meu avô paterno Joaquim José Ferreira que, também, era poeta e músico, ouço de longe os sons de guitarras portuguesas, de bandolins, de violinos, de violões e de um piston melancólico e, aí, então, as lágrimas cobrem o meu rosto.
Divinópolis, 16.01.08