A MOÇA DO KARMAN GHYA VERMELHO

“A moça do Karman Ghia Vermelho”

dener versiani kröger*

Meu amigo e professor Antonio Augusto Souto excitou-me a descrever um dos momentos mais felizes e descontraídos pelo qual passei por toda a minha vida . Foi quando lá pelos idos anos 70 tive a graça e o privilégio de ouvir o programa do Hélio Ribeiro, este, dono de uma voz ímpar, à contrabaixo e, que muito diferenciava do som de taquara rachada dessas que se ouve nos dias de hoje. Era ele , Helio Ribeiro, cheio de filosofias que me encantavam e amainavam idéias tolas. Seu programa era levado ao ar pela radio Bandeirantes de São Paulo.

Em vários pontos de nossa cidade nesta época reuniam-se pessoas para ouvirem o seu programa. Um meu amigo José Luiz, juntamente com Tuzim Xavier, do Ó, e vários outros o ouviam na sapataria de Aclínio, localizada no sobrado de João Mauricio bem ali nos fundos da Matriz de Nossa Senhora e São José, através de um radio receptor da marca Mitsubishi. Sabido é que a essa sapataria o Hélio Ribeiro já teria mandado vários recados. Ah estou falando da sapataria veneno

Eu e mais um tanto de amigos, Neném, Paulinho e Arthur éramos cativos postados de qualquer maneira ao entorno de um padrão cemig na entrada da casa de Paulinho. Já nesta situação, a sintonia era habilmente dada por um rádio Telespark tocado a oito pilhas grandes que mais parecia um transformador. Tinha mais faixa que um código de barras. Tudo AM

A nossa turma era eclética, uma mistura de tudo.

À época jorrava uma energia toda fecunda em idéias nascidas em Woodstock, Simom, Beatles, Roling Stones e tantos outros mais genesiados em meio à ditadura.

Muito destemidos éramos e, sempre na moda. Eu com camisa de malha, descolorida com água sanitária e, usando tênis Kichute . Arthur, filho de Dr. Jardim, dava uma de Don Juan com uma calça de Helanca comprada na cooperativa do D.E.R. na conta de seu pai. Neném com calça e Jaqueta Lee e Paulinho usava sempre Terbrim, um sucessor do tergal.

Como não podíamos ficar com fome, sempre que sentávamos para ouvir o Helio Ribeiro, antes tinha sempre que haver um malfeito e, este se dava por ocasião em que subtraíamos fraudulentamente mexericas e cana-caiana em uma chácara próxima a nossa casa, de propriedade de um tal de Joval.. Já houve caso de furto de frango (esta será outra história)

Tinha aquele radialista, Hélio Ribeiro, a leveza de traduzir as mais diversas músicas, não importava fossem elas em inglês, italiano ou francês, como ele próprio dizia vertia-as para o português, e que, a isto, o mesmo dava o nome de versões livres e, com muita propriedade inseria em meio a suas traduções, mensagens que nos levava a refletir sobre o cotidiano e, isso muito nos emocionava.

Tecia críticas com as mais ricas fundamentações, sem hostilizar nenhum dos criticados. Parece até que teria ele engolido o artigo quinto da Constituição da República de tanto que respeitava os direitos e deveres. Nunca usou o direito de preservar o sigilo da fonte. Ora, ele era a própria.

O seu programa era “O Poder da Mensagem” e, em épocas oportunas tinha dizeres pertinentes como; O dia dos pais, dos namorados , das mães, da pátria e por aí afora. Não me lembro de nenhuma vez em que ele tenha desagradado alguém mas, derramar lágrimas sim e , por várias vezes, pela sua sentimentalidade, carisma radiofônico e, sobretudo, a maneira de conduzir as palavras. As conduzia de forma ordenada tal qual um pastor conduz suas ovelhas.

Nos dias de hoje inexistem programas ao status do Helio Ribeiro, a nos satisfazerem ou nos prenderem de forma culta e proveitosa, (tem um programa de Francisco Carioca e outro em Belo Horizonte que o imita mas, de loooooonge). Nos dias atuais sinto-me um humano perdido e extraviado em meio a tantas ondas hertzianas tolas espalhadas por esse universo radiofônico. É, o mundo evoluiu para pior. Pior ainda é que o pior tomou lugar. Ficou pior? (ele era dono desta redundância, de forma propositada)

Das tantas falas de Hélio Ribeiro, uma das que mais ficou marcada foi a definição de fé que o mesmo sacou de Santo Agostinho: “ Ter fé é assinar uma folha em branco e deixar que Deus escreva aquilo que ele quiser”.

Pois bem!, Ao terminar, justifico o título desta matéria; o amigo Antonio Augusto Souto escreveu a loira do volvo. Não tem nada a ver mas, o que me intrigou foi; O que Hélio Ribeiro mais gostava de dizer é que seu programa era ouvido pela Moça do Karman Ghia vermelho.

*Acadêmico de Direito e sócio honorário da Aclecia

DENER
Enviado por DENER em 16/01/2008
Reeditado em 16/01/2008
Código do texto: T819060