A MORTE E A VAIDADE.

Certa vez, li em “promenades”, passeios, “visita guiada ao cemitério Père Lachaise”, com especialista no sítio. Isto em jornal destinado às atrações; Pariscope.

Minha mulher sempre relutante com essas visitas, acedeu. Gosto da estatuária. O cemitério de Montparnasse, por exemplo, é incrível em surrealismo de esculturas mortuárias. Incomparável a qualquer outro, pequeno. Já o Père Lachaise é quase um bairro. Ruas e mais ruas.

Local de arte invulgar da estatuária, doado pelo Rei Sol, Luiz XIV ao seu confessor, Padre Lachaise, o local que mais tarde resolveu problema sanitário sério de sepultamento na cidade, sendo antes local de abrigo e educação de infantes jovens e carentes.

Thiery Le Roy, o guia. Pseudônimo logicamente.Figura interessante, amante do Rio de Janeiro. Elogiou a estatuária do São João Batista, inclusive tendo em seu site o túmulo de santos Dumont.

O guia não era uma pessoa qualquer. Extremamente culto, conhecia toda a vida dos célebres sepultados bem como dos escultores famosos construtores dos túmulos.

O guia em três hora e meia de brilhantismo encerrava seus comentários sobre as celebridades, todas poderosas, principalmente quanto aos marechais de Napoleão como Lefebvre, dizendo, mas estão aqui, também, todos mortos. O mesmo com Proust, La Fontaine, Molière, Balzac, Delacroix, Piaff, Chopin o próprio Kardec e tantos e tantos outros. Era seu acento permanente a mostrar que somos todos iguais, o que poucos entendem, independente de poder, talento ou riqueza.

Somente a Napoleão, o primeiro, ele referiu que, para ver onde está sepultado, há que se ir aos “Invalídes”. Mas acrescentou, mas também está morto, “ce lá tuée”. E lá está o grande conquistador, Napoleão I, em sete caixões de ébano, chumbo e de várias madeiras, que me impressionou a primeira vez que lá fui, no monumental “Invalídes”, inválidos, homenagem aos mortos e sequelados nas guerras napoleônicas, cercado de doze virgens esculpidas por Pradier, renomado escultor da época, com a abóbada do edifício vista brilhando de quase toda Paris em dia de sol, já que coberta de camada de ouro de alguns milímetros de espessura, reposta a cada cinco anos. Mas está morto, também, como deixava sempre patente no Père Lachaise, Thiery Le Roy, o notável guia.

A vaidade humana, o grande mal da humanidade!

Napoleão, o grande conquistador, exercendo ao máximo sua vaidade, colocou-se em estátua vestido como um Imperador Romano no alto da colunata, na Place Vendôme, com 43 metros de altura, cópia da coluna Trajano Romana, em formato cilíndrico com grafias evocando suas conquistas, construida com o bronze dos canhões conquistados na batalha de Waterloo. A coluna da vaidade.

O especialista e preparado guia nos deu prospectos. Em um deles está escrito, “O Cemitério Pére Lachaise é um Teatro onde vivem os mortos e se colocam em cena sobre o tema das paixões e das vaidades humanas. Eu vos convido a me acompanhar ao grande espetáculo da vida e da morte”.

Celso Panza
Enviado por Celso Panza em 03/11/2024
Código do texto: T8188941
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