Macarronada
Domingo era dia de macarronada na casa da vó. Não precisava nem olhar no relógio para saber que era quase meio-dia, porque o cheiro já invadia a rua inteira, anunciando que a festa começava. Tinha algo de sagrado naquela rotina simples: os dois filhos chegando com as famílias, as vozes animadas dos netos ecoando pela casa, os primos se reencontrando como se fosse a primeira vez.
Na cozinha, a vó comandava como uma chefe de guerra. Com aquele avental já surrado e o cabelo preso de qualquer jeito, ela fritava o frango com uma agilidade que só as avós têm, enquanto mexia o molho de tomate, bem caseiro, que borbulhava na panela. Cada ingrediente parecia ter a medida exata, e ninguém ousava mexer ou sugerir. Era a receita dela, o jeito dela, e pronto. Nós, as crianças, ficávamos na expectativa, fingindo brincar pela casa, mas de olho na cozinha, esperando o “pode servir”.
Os adultos puxavam conversa na sala, riam das mesmas piadas e falavam das mesmas histórias, como se cada domingo fosse um reencontro com o passado e com o presente. Era um ritual que, naquele tempo, a gente nem sabia que estava vivendo. Para nós, era só mais uma macarronada. Hoje, penso que eram, na verdade, pedacinhos de memória que ela cozinhava para a gente.
Depois que a vó se foi, cada um tentou, de algum jeito, repetir a receita. Não era difícil, teoricamente. Macarrão, molho de tomate, frango frito. Mas algo sempre faltava. Talvez fosse o tempero que ela guardava em segredo, ou o jeito de mexer o molho, ou, quem sabe, aquele amor simples e sincero que ela colocava em cada panela.
Agora, quando nos encontramos, é raro alguém fazer macarronada. Acho que temos medo de que o sabor traga uma saudade que machuca. Mas, em cada encontro, ela está ali, nas lembranças, nos risos, nas histórias que contamos e recontamos. Mesmo sem o prato de domingo, ainda sentimos que, de algum jeito, a vó está ao nosso redor.
E, vez ou outra, entre uma conversa e outra, alguém diz: "Lembra da macarronada da vó?". E todos sorrimos, com os olhos brilhando, sentindo que, naquele instante, ela está mais presente do que nunca. Porque algumas memórias não morrem; elas seguem vivas, aquecendo o coração e trazendo um gosto de saudade, como aquele frango frito e o molho de tomate borbulhante que ela fazia tão bem.