A LIÇÃO DO CACHORRO
Esses dias assisti um vídeo curto de um cachorrinho que sofreu um acidente , um atropelamento , e teve que amputar suas duas perninhas dianteiras. Passou por um longo tratamento onde esteve à beira da morte algumas vezes , mas ao final , depois de muito perrengue conseguiu se recuperar. Como sequela continuou sendo o amigo de patas , mas somente de duas patas e teve que se adaptar com apenas as patas traseiras , o que dificultou muito a sua mobilidade. O mais surpreendente de tudo isso não foi o fato dele aprender a se locomover apenas com as patas que lhe restaram , o que mais surpreendeu foi que em nenhum momento ele se sentiu diminuído pela nova realidade em que se achava.
No momento seguinte em que pôde se movimentar sem dor e sofrimento , parece que começou uma nova vida , como se deste momento em diante no seu pequeno cérebro de cachorro ele nunca tivesse tido , algum dia, patas dianteiras.
Aprendeu a andar , mas agora não era mais um quadrúpede , não precisava mais de quatro patas , corria , saltava e brincava em apenas duas patas. Não sentia falta daquilo que nunca teve (tenho certeza que ele não lembrava mais que um dia teve quatro patas).
Na sua visão de cachorro ele se achava normal.Jamais questionou sua deficiência. Não se comparou aos demais cachorros. E mais incrível ainda, nenhum cachorro notou a deficiência do nosso amigo de (duas) patas.
Ao ser humano falta esta capacidade de esquecimento de seus infortúnios . Quando algo de ruim acontece levamos para o resto de nossas vidas as sequelas desta falta não somente físicas , mas emocionais de nossos problemas o que abala totalmente nosso lado psicológico nos deixando como que mutilados não só em corpo , mas também no nosso espírito.
Lembrou-me da história dos dois monges que estavam para atravessar um rio quando se deparam com uma mulher ao lado deles pedindo para que a ajudassem atravessar também. O monge mais velho colocou a desconhecida nas costas e a levou até a outra margem.
Continuando pelo caminho o monge mais novo criticou o colega porque os dois haviam feito votos de nunca tocar uma mulher no que o monge mais velho respondeu:
Eu carreguei aquela mulher já faz horas , porque você continua a carregá-la?
O filósofo Jean Paul Sartre dizia que o mais importante não é o que acontece conosco , mas o que nós fazemos com aquilo que nos acontece.
Isto é , as coisas que fazem com a gente ou o que acontece conosco não são relevantes, o que é relevante e como reagimos.
O cãozinho virou a página e deu a volta por cima , mesmo com duas patas, e continua a viver normalmente, coisa que dificilmente acontece com o ser humano.
Nos apegamos tanto às coisas que acontecem que acabamos carregando-as pelo resto de nossas vidas , assim como monge da história.
Devemos ser como o cachorrinho. . . Pernas? Que pernas?