Foto, suspiro e saudade

Depois de um dia longo e pesado, mas não pesado por ter feito várias coisas durante o dia, pesado no sentido energético, no coração. Aquele dia que já começa do avesso e parece que tem algo atravessando aquele espaço entre a garganta e o peito. Esse dia ensolarado e eu vendo tudo meio nublado, finalmente chegou ao fim, hora de voltar para casa, e aquele pesar de cansaço estava com o bônus da sensação estranha. Abri minhas listas que faço mentalmente para organizar tudo que devo fazer durante o dia e aparentemente tudo tinha sido feito. Resolvi então, ignorar essa relutância do meu corpo em insistir que algo estava fora do lugar, talvez, fosse alguma coisa que eu tivesse comido na hora do almoço e não caiu muito bem. Na tentativa de distrair ou desfocar meus pensamentos, peguei meu celular para ver os e-mails que acabo deixando acumular na caixa de entrada, e por sorte ou azar, a bateria estava totalmente descarregada. Novamente sou eu e meus pensamentos. Mas sou tão inquieto, que não leva muito tempo para eu arrumar algo para fazer e tentar esquecer o que a minha intuição tenta dizer, normalmente ela se comunica por códigos e eu estava muito cansado para tentar decifrá-los. Tirei do bolso minha carteira, e eu, com uma forte mania de organização, comecei a ajeitar o que tinha dentro dela. Primeiro o dinheiro, as notas viradas sempre com o rosto para frente e em ordem decrescente, depois aqueles inúmeros cartões de visitas que tenho o costume de acumular sempre que vou em lugar novo, e os documentos que coloco todos juntos em um dos compartimentos plastificados. Por fim, vasculho todos os buraquinhos na esperança de encontrar algum dinheiro esquecido ou até mesmo um cupom de alguma promoção que havia guardado para um momento futuro e acabo não lembrando. Quem procura, acha. Era o que minha mãe costumava dizer, e em um dos buracos quase que impossíveis de mexer, uma foto um pouco maior que aquelas 3x4, foi puxada numa rapidez, que quase metade da foto fica na carteira. Você estava sorrindo, e num passar de mágica eu estava naquele barco em Veneza e você com vergonha de tirar aquela foto, acabou forçando um sorriso meio amarelado e em seguida veio esse sorriso, o da foto, o mais lindo de todos, entre o fim da primeira foto obrigatória e sua distração momentânea eu captei a sua melhor pose. Já tem mais de dez anos essa foto e eu não lembrava que estava guardada ali, na verdade, já não lembrava como seu sorriso era tão bonito e alinhava perfeitamente com seus olhos. Seus olhos eram tão sorridentes. Depois de algum tempo viajando naquela foto meio envelhecida, um suspiro de alívio veio ao mesmo tempo que uma lágrima escorreu do meu olho esquerdo, nós sabíamos que o lado esquerdo era lágrima de tristeza, e um suspiro demorado foi aliviando o peito. Eu, meio sem jeito passei a mão no rosto rapidamente e guardei a foto com cuidado no mesmo lugar, levantei apressado pois já estava na minha hora de descer. Muitas vezes manipulamos a mente com exercícios diários para esquecer algumas coisas, mas o coração atento e já acostumado, acaba lembrando mesmo que inconscientemente de momentos e datas importantes. O coração estava sufocado de uma saudade reprimida. Esse mesmo dia tornou-se há algum tempo estranho. Hoje completa cinco anos.