Confraria
Estava confortavelmente lendo um livro, quando sentou-se próximo a mim alguém que não via há alguns anos. Foi na sala de espera onde eu aguardava minha esposa que fora fazer tratamento com acupuntura.
Dado a saudade confessada por ambos, travamos um bate-papo animado. Ele contando as peripécias dos passeios de bike (conhecida antigamente como bicicleta). A maior proeza que ele havia feito foi no exterior quando pedalou 5.000 km. Vou aproveitar as tiradas divertidas do personagem Maxwell Smart, o Agente 86, como se estivesse conversando com ele.
- Acho muito difícil de acreditar.
Você acreditaria se fosse 4.000 km?
Ainda não acredito.
- E se fosse 100 km de trem, você acreditaria?
Ele se vangloriava da capacidade de locomoção embora reclamasse que quase estava ficando cego.
Eu reclamava da pouca mobilidade proveniente de cirurgia feita nos dois quadris.
A conversa ficou animada quando iniciamos a falar o que fazíamos junto aos amigos da empresa em que havíamos trabalhado até nossa bendita aposentadoria. Ele trabalhava no departamento de materiais e eu no de obras, portanto tínhamos algum contato.
Minha turma se reúne toda quarta-feira e a dele, uma vez por mês, às quintas-feiras. O nosso grupo tem o nome de Panela Futebol e Dominó. Hoje o termo futebol não é mais usado porque abandonamos, face à idade que não nos permite realizar tais contendas saudáveis.
A turma dele tem o nome de Confraria do Jurerê.
Esqueci de falar que todos o chamamos de Primo.
O pessoal que faz parte da turma dele é um pouco diferente da nossa, no meu ponto de vista. Tem aquele que uma vez desconfiou da honestidade da minha pessoa e até hoje não esqueço e não o perdoo por isso. Sei que estou cometendo pecado, mas é o meu jeito de ver as coisas.
Outro, certa vez viajando comigo, paramos num boteco de beira de estrada e eu pedi uma linguiça no pão de trigo. Ele olhou para mim e parecia que tinha nojo da minha atitude. Saboreei aquela iguaria que, devido à fome que eu sentia, parecia manjar dos deuses.
Teve um que até participou algumas vezes de nosso grupo, mas não se adaptou. Nunca justificou a saída e também não nos interessou o motivo, já que enquanto esteve conosco não agregou nada ao nosso agrupamento.
Na minha opinião nosso grupo é simples e o deles, nem tanto.
Brincamos uns com os outros o tempo todo, fazendo gozações que são aceitas e nunca brigamos entre nós. Imagino que entre eles a coisa é séria e que o assunto recaia sobre, comida, vinhos e principalmente sobre serviço, já que quase todos ainda estão trabalhando.
Ouso dizer, não somente ao meu amigo Primo, pessoa que admiro, e mais a quem interessar possa:
- O que você não deixa ir, você carrega. O que você carrega, pesa em você, e o que pesa em você, te afunda.
Pratique a arte de: soltar, perdoar e deixar ir.
Nossa turma curte a vida como se fosse uma câmera fotográfica. Foca sempre no que é importante, captura bons momentos, desenvolve a vida a partir de negativos. E se as coisas não derem certo, tira outra foto.
Aroldo Arão de Medeiros
18/10/2024