Elevadores e esperas - sobre apertar botões para o outro
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Moro há pouco mais de quatro anos no mesmo prédio. É um condomínio simples, com quase quarenta apartamentos. Uma parte deles é ocupada apenas nos finais de semana de calor, pois o edifício fica a cerca de 200 metros da praia, e a cidade é turística. A rotina aqui é bastante tranquila, quase não se ouve barulho ou ruído de existência humana, o que muito me agrada. Adoro as manhãs silenciosas e frias em que posso desfrutar de um café quente, uma boa música clássica e a escrita. Normalmente, consigo progredir bastante nos textos e o resultado, com certa frequência, até que me agrada bastante.
Morar em prédio nem sempre é uma experiência tranquila. Todos conhecemos inúmeras histórias de problemas, confusões, barulhos e desavenças enfrentados por quem habita essas construções. Para minha sorte e alegria, aqui, isso não costuma acontecer. É certo que não sou um vizinho lá muito sociável. Até hoje, não criei laços com ninguém, me limitando a ser cordial com todos que encontro nas áreas comuns, cumprimentando e me mantendo em silêncio na sequência. Vez ou outra, acabo provocado por algum vizinho a comentar trivialidades típicas dos segundos dentro do elevador, coisas sobre o clima, a chegada do fim de semana, o movimento na cidade, e por aí vai. Chego rapidamente ao terceiro andar, onde moro, e adeus ao momento de cordialidade. Fecho a minha porta e encontro o silêncio de que tanto gosto.
A vida ali transcorre como qualquer outra, repleta de tarefas domésticas, alimentação, descanso, preguiça, beijos, carinhos, desentendimentos, alegrias, tristezas, gatos, livros, cachorro e tudo o mais que se possa imaginar existir em um lar. A novidade mesmo surgiu do lado de fora, no subsolo, pra ser mais preciso, num dos pisos de garagem. Dois elevadores servem aos meus vizinhos e a mim. É bastante comum, quando estou estacionando o carro, alguma pessoa mais adiantada tomar o elevador que já está ali, aberto, e seguir o seu rumo; ou ainda, chamar apenas uma das caixas de claustrofobia e se locomover até a sua residência. Normal, é o que a maioria das pessoas faz, inclusive eu. Mas, lá no condomínio, houve quem agisse diferente.
Com certa frequência, encontro um casal e seu filho, que moram num dos apartamentos. Às vezes, vejo apenas um deles saindo ou chegando, aparentando um pouco de pressa. Parecem estar indo ou vindo da academia. São de aparência saudável, com ar jovial, embora eu acredite que já tenham passado dos quarenta. Nas oportunidades em que nos aproximamos, não passamos de simples trocas de cumprimentos. São eles os autores do gesto que pra mim soou inovador, diferente. Isso se repetiu algumas vezes até que eu atinasse para o quanto ele era e é significativo.
Mais de uma vez, ao me verem manobrar o carro, eles chamam um elevador para si, vão até o outro e apertam o botão a fim de que eu, ao chegar na porta, já o encontre disponível e não precise esperar. Quando me dei conta dessa atitude de gentileza e atenção dispensados a mim, percebi o quanto um simples gesto faz muita diferença nessa minha vida pouco sociável. Isso se repete sempre que nos encontramos e penso que fale muito sobre a índole daquela família, sem que nunca tenhamos empreendido diálogo algum. É raro encontrarmos por aí pessoas preocupadas com a pressa alheia, muito menos quando nem sabem se elas realmente têm pressa ou não. Provavelmente, meus vizinhos nem se preocupem com a minha pressa, apenas querem ser gentis e facilitar a minha vida.
O mais interessante é que esse gesto tem ganhado adeptos. Um outro vizinho, um jovenzinho muito educado e cordial, tem agido assim quando me vê chegando na garagem. E eu também comecei a adotar a mesma postura quando vejo alguém enquanto espero o elevador. É a tal pedagogia do exemplo. Ou como se diz por aí, “A palavra convence, mas o exemplo arrasta.” E que continue arrastando. Que essa onda chegue a mais e mais pessoas, arrastadas pelo exemplo de olhar um pouquinho mais para o outro. Não custa nada e sempre ajuda a quem vem depois. Entre elevadores e esperas, que prevaleça sempre a gentileza e o altruísmo.