MESÓCLISE, ÊNCLISE, PRÓCLISE
Em tempos outrora, amparado pelo vigor da juventude e dos desejos, esforçar-me-ia com mais empenho correndo atrás dos meus muitos sonhos. Leva-nos todavia o passar dos anos a reconsiderar posições, acalmar os ânimos d'alma, moderar os ímpetos. A maturidade e a experiência de vida nos mostram a planejar, refletir e calcular cada passo e medida a ser tomada.
Dar-me-ia eu uma nova primavera estando já caminhando nos campos outonais da velhice? Benzo-me cuidadoso quando imagino que poderia descansar focando no coração tamanha extrapolação de atitude. O jovem em várias ocasiões age impensadamente, certamente glorificando uma capacidade de sobrevivência a qualquer custo que não tem e nunca terá, embora se ache um super homem.
O idoso, por sua vez, a par de suas conhecidas limitações, ele sabe muito bem quais são, converge no rumo das facilidades, da segurança, do conforto protetor de não superar as fronteiras do perigo. Folgo-me, por meu turno, em jamais esquecer as fragilidades que acompanham o tempo e me mantém cauteloso. Submeto-me à idade, não me diminui em nada estancar antes das bordas dos precipícios. Aprendi a me amar e gostar da vida.
Aliar-me-ei sempre aos grupos dos cuidadosos, imprescindível lembrar a mim mesmo todos os dias que sou composto de elementos fracos como ossos, carne, músculos e órgãos que se deterioram ano após ano, factíveis assim de me porem em maus lençóis. Por que então eu me meteria a duro de morrer? Permito-me somente o possível.
As pernas bambas, os braços flácidos e a visão baça me colocam face a face com os riscos da fraqueza. Não, nunca me dou o arroubo dos esportes radicais, sem chance de em algum momento eu saltar de paraquedas ou me insinuar a valentão inventando de ser alpinista. Vejo-me apenas como realmente sou, longe de mim cortejar as probabilidades fora do meu controle, prefiro sentar-me numa varanda ao por do sol para usufruir da poesia da natureza do que me jogar nas corredeiras de um rio, na tentativa de provar o quanto sou excelente nadador.
Tratar-me-iam feito louco se o fizesse, me taxariam de alucinado...levo-me muito a sério para cometer tais insanidades. Só quero viver, agradecer a Deus por tudo, sentir-me feliz por envelhecer. Entregar-me-ei cotidianamente aos propósitos divinos enquanto me for concedido respirar, basta-me a santa graça de Deus.