Por que deixei o espiritismo

Eu fui evangélica por um bom tempo e saí não apenas por causa das decepções mas também por causa de dúvidas. Depois que deixei a religião evangélica eu me interessei pelo budismo e até pelo movimento Hare Krishna e, quando mãe adoeceu de câncer, eu me aproximei do Espiritismo. Era uma época em que eu estava com muitas angústias e buscando respostas, pois eu sempre (desde pequena) me perguntei o porquê do sofrimento humano. Assim, comecei a frequentar um centro espírita perto da minha casa.

A doutrina espírita não me era totalmente desconhecida, visto que eu já havia lido livros do autor espírita Richard Simonetti e de Chico Xavier e a psicografia Violetas na janela. Dessa forma, resolvi dar uma chance ao espiritismo, cheia de esperanças que pudesse encontrar respostas para as dúvidas que sempre tive em relação à existência humana.

No começo, achei maravilhoso. As pessoas foram muito acolhedoras, eu gostava das reuniões e de ler os livros da biblioteca. Também gostava da doutrina de caridade que imperava no lugar. A diretora do centro fazia muitas campanhas de arrecadação de alimentos e, al´dem de ler os livros de Allan Kardec e a Bíblia, assistia a filmes e documentários espíritas. Nós ainda recebíamos passes e eu confesso que sentia bastante conforto. Mulheres que davam o passe chegaram a ir para nossa casa para orar por minha mãe, que estava fazendo quimioterapia.

Porém, algumas coisas começaram a me deixar desconfortável e uma delas era a ideia de karma. Mesmo quem não segue nenhuma religião que admite a reencarnação tem uma vaga ideia do que seja karma. Segundo o que aprendi, para evoluirmos, nós vamos reencarnando e, a cada nova vida, temos que pagar o que fizemos de errado na vida anterior. Com o tempo, foi ficando mais difícil aceitar que eu pudesse ter sido uma pessoa horrível em outra encarnação e que meus problemas atuais fossem castigo pelos meus erros passados. Ainda por cima, não me parecia certo estar pagando por pecados que eu não lembrava de ter cometido.

Outra coisa que me fez começar a ter mais dúvidas foi o fato de que vieram dar o passe aqui em casa e uma das mulheres falou que viu Nossa Senhora e que Nossa Senhora dissera que mãe se curaria do câncer. Porém, mãe piorou, teve metástase e morreu. Também não pude deixar de observar certas coisas. A diretora pregava que cada um, ao lidar com um parente difícil, devia aguentar pois se tratava de uma dívida kármica, mas deixou o marido porque ele batia nela. Então, ela pregava uma coisa e vivia outra.

O que me fez deixar finalmente o espiritismo? Bem, por acaso eu descobri um blog cético (cético não é a mesma coisa que ateu), que tinha um artigo intitulado A farsa da reencarnação. Neste artigo, o autor diz que é inútil punir alguém por um erro que não lembra de ter cometido. Como uma pessoa pode evoluir se não se recorda do que fez de errado? O autor enfatiza a importância da memória para que aprendamos, adquirindo conhecimento e construindo as nossas identidades. De fato, não podemos nem mesmo melhorar como pessoas se não temos memória do que fizemos e, se não há memória, há os riscos de cometer os mesmos erros. Por que se estuda História? Para sabemos quem somos, como o passado contribuiu para ser quem somos e também para não cometer os erros dos nossos ancestrais.

O autor também mostra o quanto a doutrina do karma é elitista, porque dá a entender que uma pessoa que nasce em melhores condições é mais evoluída espiritualmente do que uma pessoa que nasce pobre, feia e burra. Essa aliás foi uma dúvida que me assaltou quando eu ainda estava no espiritismo. Eu pensava que, se vamos tendo melhores condições de vida à medida que reencarnamos, não era para todas as pessoas ricas serem evoluídas espiritualmente? E isso é algo que muitos não são.

Devido a todas essas dúvidas, eu deixei o espiritismo e, atualmente, continuo tão cheia de dúvidas e questionadora como sempre fui.