Quem não apela não leva a Capela!
Missa na Capela São Padre Pio de Pietrelcina só tem uma por semana: é no domingo, às 8:00 da madrugada!
- E tem gente que vai pra missa num horário desses?
- Só tem! Tá sempre lotada, graças a Deus!
O pessoal da Comunidade é fiel! Literalmente! Pensa num povo ponta firme, que não falha de jeito nenhum! Pula da cama com o cantar do galo em pleno dia do descanso semanal remunerado e parte com fé e alegria pra louvar e agradecer, pra pedir perdão e graça, pra ofertar o tudo e mais tudo de bom que tem no coração, pra contemplar o milagre da transubstanciação e pra participar do melhor banquete desse mundo: comungar e adorar o Senhor Jesus!
Porque, antes de ser o dia do descanso semanal remunerado, domingo é o Dies Dominicus! Dominica! É o Dia do Senhor!
Então, qual é a primeira coisa que a gente faz no Dia do Senhor? Ah, a gente vai pra igreja, cedo, mas bem cedo mesmo, pra louvar e agradecer, pra pedir e ofertar, pra contemplar e participar, pra comungar e adorar o Senhor!
E quem serve tem que chegar antes, mas bem mais antes do que o bem mais cedo! Pra deixar tudo pronto pra Celebração!
Os Ministros batem o ponto às 7:00! Pra abrir as portas e janelas, dar uma geral nos banheiros, deixar o equipamento de som naquele grau pros músicos, colocar o microfone do Padre pra carregar, preparar a Credência, verificar o Sacrário e, se necessário, colocar hóstias pra serem consagradas e - ufa! - rezar a Oração de São Tarcísio, o Mártir da Eucaristia, Padroeiro dos perseguidos pela fé que professam!
A galera da Liturgia da Palavra - Comentarista e Leitores - e o responsável pelo recebimento do Dízimo tem aquela meia horinha a mais de sono: a apresentação é às 7:30, pra realizar as tarefas do Escritório - é como a gente chama a mesinha que fica na lateral - onde os fiéis fazem aquela fila pra registrar as intenções pra missa e pra efetivar suas "contribuições financeiras mensais".
O que pega é que praticamente todo mundo que serve na São Padre Pio é Ministro e/ou Leitor! Então, a real é que a cada domingo, o que rola é um revezamento de quem chega cedo e quem chega mais cedo ainda...
Pois é! É bem aquela passagem: "A messe é grande e os trabalhadores são poucos!"
Mas a gente segue firme! Não somos muitos mesmo, não! Mas somos bastantes! E vâmo que vâmo! E, como tâmo sempre com disposição e disponibilidade, sempre da pra fazer aquele algo a mais, né? Ainda mais quando a iniciativa envolve a Mãe! Aí nem tem como dar perdido no pedido...
E tavam lá no Escritório o Dilson, nas anotações e o Ricardo, no Dízimo, quando veio a Nilma com a ideia...
- Meninos, queria ver com vocês se é possível a gente reativar o rodízio das Capelinhas! A gente foi obrigado a suspender as visitas da Santinha às famílias por causa da pandemia e não retomamos, né?
Opa, parou! Parou tudo agora!
Bora contextualizar pra todo mundo entender: a gente tinha seis Capelinhas de Nossa Senhora Aparecida, destinadas às famílias da Comunidade que quisessem receber a visita da Santinha por uma semana.
Mas por que as Capelinhas de Nossa Senhora Aparecida se a Capela é em honra a São Padre Pio e vinculada à Paróquia Nossa Senhora do Carmo?
É que quando foi instituída, ainda antes de ser construída, a Capela São Padre Pio tava ligada ao Santuário Nossa Senhora Aparecida, da Vila Marcondes!
Daí a razão da devoção à Padroeira do Brasil, materializada e mantida pelas Capelinhas itinerantes...
Então o bairro foi dividido em seis setores, pra ter uma logística bem bacana, pra ter uma periodicidade bem equilibrada e todo mundo ser contemplado e abençoado com a companhia de Nossa Senhora, rezar o Terço, agradecer, pedir e ficar bem feliz da vida por uma semana no mês!
E sempre deu muito bom! Cada família fazendo sua parte, todo mundo sempre muito responsável, as Capelinhas passadas de mão em mão, percorriam, de casa em casa, cada setor e toda a região...
Mais tarde, por questões administrativas e geográficas, a Capela São Padre Pio foi encampada pela Paróquia Nossa Senhora do Carmo, da Vila Maristela!
Mas os rolês das Capelinhas continuaram rolando do mesmo jeito!
E, vâmo combinar, que ter o privilégio de ser abençoado e protegido pelo manto azul e pelo Escapulário, juntos, não é pra qualquer comunidade, né?
Até que veio a famigerada Covid e acabou com a festa!
Mas agora a Nilma tava querendo reativar o sistema...
- Então, meninos! Pensei o seguinte: a gente podia fazer, todo domingo, no final da missa, um sorteio das Capelinhas entre os dizimistas! O felizardo leva a Santinha pra casa, fica com ela durante a semana e traz de volta no domingo seguinte, pra ser sorteada novamente! O que vocês acham?
- Maneiro demais, Nilma! Mas só queria dar uma sugestão: abrir a participação no sorteio pra todo mundo que tiver interesse em receber a Santinha, independentemente de ser dizimista!
- Eu concordo, Ricardo! E, como já tô de Comentarista hoje, informo no final da missa que vâmo fazer os sorteios a partir do domingo que vem, com os nomes dos dizimistas e de quem mais quiser e vier aqui no Escritório pedir pra ser incluído...
- Taí, gostei! Ótima ideia! Tem que ser pra todo mundo que quiser ficar com a Mãe, mesmo! Manda a listagem pra mim por favor, Ricardo, que eu digito os nomes, imprimo e recorto os papéis pra sortear! Domingo a gente faz o primeiro!
E começou...
E deu muito bom! A cada domingo, seis famílias contempladas! Seis famílias abençoadas com a companhia de Nossa Senhora, pra rezar o Terço, agradecer, pedir e ficar bem feliz da vida por uma semana inteira!
Só não tava dando tão bom assim pra quem tava na fila e, domingo após domingo, chegava pra missa naquela expectativa de ter o nome chamado pelo Padre e acabava indo embora com a frustração de não poder levar a Capelinha pra casa.
Tá certo que todo mundo sabia que, mais cedo ou mais tarde, seria agraciado, mas é aquela coisa: todo mundo quer pra hoje!
E não tinha uma pessoa que tava no mais puro creme da ansiedade do que a Dona Lígia!
Todo sábado mandava mensagem pro Ricardo no Zap: "É amanhã, hein! Amanhã vou receber a graça da visita da Santinha!"
E todo domingo, antes da missa, passava ali pelo Escritório e repetia pro Ricardo:
- É hoje, hein! Hoje vou receber a graça da visita da Santinha!
E todo domingo o Ricardo sorria e respondia:
- Paz no coração, Dona Lígia! Espera e confia, que a Mãe vai! No dia mais propício a Mãe vai...
E repetia pra ele mesmo:
- Paz no coração, Ricardo! Espera e confia, que no dia mais propício a Mãe vai...
Porque ele também não tinha sido sorteado ainda e tava no mesmo puro creme da impaciência da Dona Lígia!
E não é que aquele domingo foi o dia? O Ricardo foi um dos felizardos que teve o papelzinho puxado pelo Padre!
- Oh, Glória!
E o puro creme da sofreguidão se converteu no puro creme da alegria!
No domingo seguinte, o Ricardo tava de Comentarista e, antes do sorteio das Capelinhas, aproveitou pra fazer um elogio e mandar um recadinho.
- Pro pessoal que já foi sorteado, gostaria de parabenizar e agradecer do fundo do coração pelo compromisso e pela responsabilidade: todos que levaram a Santinha pra casa num domingo trouxeram no próximo pra que aqueles que tão no aguardo tenham a possibilidade de viver essa maravilhosa semana com a Mãezinha! E, pra quem ainda não teve a sua vez: paz no coração! Espera e confia, que a Mãe vai! No dia mais propício, a Mãe vai...
- E bora fazer o sorteio de hoje!
E aí aconteceu o incidente!
Adivinha só o primeiro nome que o Padre pegou:
- Ricardo Sestim!
Aí a igreja inteira olhou pro Ricardo...
- Opa, parou! Parou tudo, pessoal! Tem coisa errada aí! Fui sorteado semana passada! Meu nome não podia estar aí pra ser sorteado de novo!
Então o Padre puxou outro papel.
- Rivaldo Frotas Amoreira!
- Opa, parou! Parou tudo de novo! É o Seu Duda! E ele também já foi sorteado! Ah, já entendi! Dilson, cê pegou a sacolinha errada! Da uma olhada aí e mostra pro pessoal entender também!
- Bora deixar tudo bem esclarecido, então! Pra ninguém pensar que tem marmelada no Sorteio das Capelinhas! Funciona assim, pessoal: temos duas sacolinhas com os nomes de vocês, a dos que já foram sorteados e a dos que ainda não foram, justamente pra não acontecer o que aconteceu hoje!
- O que deu errado foi que o Dilson pegou a sacolinha com os nomes de quem já foi sorteado e aí puxou o meu nome e o do Seu Duda...
- Mas, no fim das contas, esse equívoco foi até bom, porque serviu pra mostrar a correção, a lisura, a probidade e a transparência dos nossos procedimentos...
Então, o Dilson pegou a sacolinha com os nomes dos não sorteados e vida que segue!
E adivinha quem foi contemplada? Ah, ela mesma:
- Lígia Geber de Souza!
Pensa numa pessoa que ficou no mais puro creme da felicidade...
No domingo seguinte teve mais uma fora da curva...
- Então, vamos ao Sorteio das Capelinhas!
- Padre, por favor! Eu preciso falar!
Era a Maristela!
- Me contaram que meu nome já foi sorteado duas vezes! Eu preciso justificar e quero fazer um pedido: nas duas vezes eu não tava aqui na missa porque tava em trabalho na Catequese lá na Matriz e, por isso, peço encarecidamente ao Senhor e à Comunidade que permitam que eu leve uma Capelinha hoje! Eu tenho uma devoção imensa, Padre! Eu ficaria feliz demais com Nossa Senhora lá em casa! Prometo que vou rezar o Terço todo dia!
E as lágrimas correndo pelo rosto! Dela e de mais uma galera! Só todo mundo...
E é claro que o Padre e a Comunidade toda concordaram! E é claro que mais lágrimas correram pelo rosto! Dela e de todo mundo...
- Então agora vamos ao sorteio!
E adivinha só o qual foi o primeiro nome que o Padre pegou! Ah, ela mesma:
- Maristela Castelaro!
Aí é que as lágrimas correram pra valer pelo rosto! Dela e de todo mundo...
- Nem precisava ter queimado a largada, Maristela! Já tava tudo preparado pra hoje ser você...
- Agora eu sei! Mas é que eu tava na maior angústia! Duas vezes e eu não tava aqui! Fiquei com medo do meu nome não sair mais e aí fui pro tudo ou nada! Quem não apela, não leva a Capela!
E, no domingo seguinte, mais um acontecimento inusitado.
O Padre pegou o primeiro papel, leu o nome do contemplado e ninguém se manifestou. E também não tinha nenhum parente e nenhum vizinho pra levar a Capelinha pra pessoa.
- Esse faltou hoje! Bora pro próximo!
Pegou, leu e...
- Não veio também? Vâmo pegar mais um!
E foram mais quatro nomes! E os quatro também não tavam presentes! E não tinha parente nem vizinho...
- Mas, rapaz! Isso nunca aconteceu antes!
- Padre, eu não sou dizimista e também não pedi pra colocarem meu nome no sorteio, mas se o Senhor permitir e todo mundo concordar, eu levo a Santinha pra casa hoje!
Era a Dona Senhorinha! No puro creme da atitude!
- Eu é que não vou deixar Nossa Senhora sem abrigo! De jeito nenhum!
- Ah, Dona Senhorinha! A Senhora é demais! Mas ainda tem dois nomes aqui na sacolinha e a gente precisa ser justo com essas pessoas! Então eu vou ter que fazer o que é correto e continuar o sorteio e, se nenhum dos dois estiver aqui, a Senhora vai poder levar a Capelinha!
Aí a torcida toda ficou a favor da Dona Senhorinha! Não teve um que não desejou, lá no fundo do coração, que as duas pessoas não tivessem na igreja - ah, perdão Senhor! - pra Dona Senhorinha ser premiada pela postura muito, mas muito mais que louvável!
O Padre leu o primeiro nome: suspense total, respirações presas, silêncio absoluto! Ninguém...
- Só falta um!
O Padre pegou o último papel, abriu e leu: segundos que pareceram décadas!
- Ninguém? Então pode levar, Dona Senhorinha!
E aí a igreja veio abaixo!
- Parabéns, Dona Senhorinha!
- Pois é, meu filho! Tem certas ocasiões em que a gente precisa ir pro tudo ou nada! Quem não apela, não leva a Capela!
E, na semana seguinte - pra variar - também não faltou emoção.
Todos os papeis voltaram pra sacolinha dos Não Sorteados pra começar a segunda rodada das visitas das Capelinhas.
E adivinha só quem foi a primeira sorteada! Ah, ela mesma:
- Lígia Geber de Souza!
- Mas que coisa, hein Dona Lígia! Demorou uma vida inteira pra ser sorteada pela primeira vez e agora já emplacou de cara na estreia da segunda!
- Pois é, Ricardo! O pessoal não fala que quem não apela, não leva a Capela? Então eu também resolvi apelar! Apelei direto pra Ela!
E abraçou a Capelinha, com o maior carinho do mundo...