FUI ANTES DE TUDO UM FORTE

O povo nordestino flui da simplicidade, do suor, das vicissitudes, da indiferença. Sempre viveu e morreu sendo parte do conjunto de trabalhadores castigados pelas intempéries causadas pelo abandono político e social, pela seca, a incerteza, a fome. Alvo fácil dos espertalhões cheios de promessas falsas e vãs, o nordestino é nascido do sol, da falta d'água, dos partidos políticos comandados por caciques acoronelados donos de currais eleitorais em troca de migalhas. Um proeminente esquecido.

O nordestino tenta ser forte, agarra-se à esperança, no entanto chora diante da estiagem prolongada que suga e mata suas pequenas plantações de sobrevivência. Ele viu o diabo amassando o pão, o mesmo pão posteriormente entregue a si para comer com a família, o mínimo do mínimo de maneira a que tenha forças apenas e suficientes para subir no pau de arara e seguir, famélico e aos frangalhos, com destino a São Paulo. Atrás de melhor sorte. Os poucos pertences, quase nada, ficando entregues aos estragos do tempo, ao léu, sob o abandono das possibilidades e o sarcasmo do sol.

A vida sempre foi assim para o nordestino, mormente o pequenino, explorado, pisoteado pelas botas sujas de alguns latifundiários gananciosos amigos de parlamentares influentes. Vivi essa triste realidade outrora, chorei tantas vezes observando a quase miséria própria e a do próximo, comendo na mão dos poucos poderosos donos de nossas vidas.

Por isso, em vivendo o mórbido horror da terra onde nasci, notei que havia somente uma saída, o estudo, o mérito, o aprendizado, o conhecimento. Nesse intuito, o da mudança transformativa, desde a infância embrenhei-me nos passos das probabilidades, sem perspectivas mas estudando e lendo feito um louco, na busca por um futuro diferente e melhor. Os óbices, as barreiras e as limitações financeiras, exército forte ante o insignificante nordestino infantil, surgiram arrogantes, por muito pouco não lograram o intento de me deter. Fui antes de tudo um forte.

Enquanto outros brincavam eu lia, anotava, aprendia, sentia a dor da falta do necessário. Tinha o mais básico do básico, a água, o pão e o café. Para não adoecer de fome, para não morrer. Malgrado tudo, vim, vi e venci, graças a Deus! Pisei duras pedras, queimei os pés na secura do solo ressecado, banhado em lágrimas vezes tantas, tropecei nos mata-burros, deparei com cancelas fechadas, todavia, por Deus!, nada me deteve.

Nas toscas salas de aula das escolas municipais, no colégio estadual, nas noites intermináveis queimando as pestanas, ouvi, li, aprendi, conheci, lutei contra todos os impedimentos até alcançar a honra da vitória. Graduei-me em Direito, fui aprovado no concurso do Banco do Brasil, numa das mais acirradas concorrências e, enfim, cheguei ao fim do túnel, Deus seja misericordioso! Começava outra etapa na existência desse nordestino, Deus é grande e fiel! O resto é história.

Eu, um nordestino lá das brenhas do Rio grande do Norte, conheço vários países da Europa, entre eles França, Portugal, Espanha etc, inclusive a Escandinávia, também Argentina, Canadá e Uruguai, tudo com a santa graça de Deus! Neste dia do nordestino, portanto, primeiro agradeço a Deus, depois exalto e respeito todos os que mudaram suas vidas estudando, aprendendo, lendo e conhecendo, daí então vencendo todos os obstáculos ao fim dos quais chegamos ao topo, onde enfiamos na terra a bandeira da luta, da honestidade e da perseverança. O esforço valeu a pena.

Gilbamar de Oliveira Bezerra
Enviado por Gilbamar de Oliveira Bezerra em 08/10/2024
Reeditado em 09/10/2024
Código do texto: T8168981
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