Eu queria uma bicicleta nova
Pedalar não é preciso.
Acordei com a expectativa de encontrar um mundo melhor, correndo pelas ruas como uma criança tentando escapar dos pais, sem perceber os riscos que a vida nos apresenta para o pão nosso de cada dia. No entanto, quanto mais corremos, menor será a distância que alcançaremos se não soubermos voar. Em certas ocasiões, precisamos agir como as aves que se elevam nas correntes de ar quente que emergem do solo.
Adoro voar pelas ruas da cidade em cima de uma magrela que já está para lá de Bagdá. Por vezes, sinto-me como a bala que matou Kennedy, pedalando por longas horas, enfrentando todos os perigos que uma metrópole nos apresenta. Não determino horário ou local, apenas saio quando sinto vontade de deixar o meu refúgio, que mais parece uma casa de joão-de-barro no meio de tantas plantas.
Confesso que tenho um pouco de paúra, mas se a formiga tivesse medo não sairia de casa na terra dos elefantes.
Em um dia específico, percorri a cidade às cegas, tentando impedir que os meus desejos mais belos se perdessem nos labirintos dos meus temores. Cada pedalada um desejo, cada piscar de olhos um mundo inédito se descortinava. Após centenas de pedaladas, completamente exausto, desci da bicicleta para um breve descanso. A escalada era árdua, mas nada que me fizesse desistir. Um indivíduo, do outro lado da rua, armado com um pau, bradou: "perdeu!" Você perdeu! Fiquei perplexo, estático. Ele inspecionou a pobre bicicleta, conferiu os pneus e declarou: sua bicicleta é uma bosta, não vale cem reais. Que alívio! Depois daquele dia percebi que a minha magrela vale ouro.
Desejava comprar uma bicicleta nova. Quando entrei na loja, optei por uma bem atraente, com várias tonalidades de preto e vermelho. Questionei o valor. O vendedor me encarou e afirmou: esta bicicleta não é adequada para o senhor, é muito cara. Fiquei tão irritado quanto um siri na lata.
__ Ah, quanto tempo levei para compreender o que ele queria me dizer!