O centroavante do Criciúma

 

Ontem fui levar um amigo veterano, 23 anos mais velho que eu, pra assistir Grêmio x Criciúma na Arena. Motivo: ele treinou e jogou amistosos pelo Criciúma em 1965, mas nunca viu jogos do mesmo em Porto Alegre. Bom, chegou a oportunidade. No busão do Consulado do Grêmio de Charqueadas fomos conversando sobre aquele tempo.

 

Pedro tinha dois amigos também com 20 anos, Zé Carlos e Irani. Os dois resolveram ir pra São Paulo, mas Pedro não. Entretanto, um fato mudaria o rumo dos acontecimentos. Beca, irmão dez anos mais velho que Pedro, era jóquei. Zeca havia saído da empresa onde trabalhava e tava com uma boa grana da rescisão. Beca então deu uma dica pros rapazes: poderiam juntar todo o dinheiro que possuíam e apostar no cavalo que ele montaria em determinado páreo, pois o mesmo perdera feio um tempo atrás, mas agora estava voando nos cascos. Mais: poderiam dar um corpo de vantagem, que o prêmio seria maior. Juntaram à grana de Zeca o dinheiro que possuíam e confiaram em Beca. Pimba!

 

Montados numa baita grana, dividida entre os três, seguiram para São Paulo. Ah, Pedro prometera aos amigos que, se ganhassem a aposta no cavalo de Beca, iria junto. Em Porto Alegre, foi comprar as passagens e viu que uma loira alta, de olhos verdes, comprara a poltrona 7. Adquiriu a 8. Vai que, né? Zeca, na fila da frente, foi com uma freira e ficou contrariado. A moça percebeu e puxou conversa com Pedro. Aos 20, jovem, bom papo e bonitão, chamava a atenção das mulheres e Isabel gostou dele. Numa parada foram comer juntos e ela perguntou para onde eles iam. Ao saber, disse que em Criciúma também havia bastante emprego. Perguntou o que Pedro sabia fazer e ele respondeu que jogava futebol. Centroavante ambidestro, treinava e jogava no Jeromina, de Charqueadas. Pois então, o pai de Isabel era grandão na cidade e possuía contatos no Comerciário (atual Criciúma)...

 

Sendo assim, os amigos decidiram ficar por Criciúma, já que Isabel e seu irmão gerenciavam um hotel onde eles poderiam ficar, com algumas vantagens. Isso era agosto de 1965, e Pedro ficou por lá até outubro na boa, namorando, treinando e jogando alguns amistosos, recebendo um apoio de aproximadamente uns 500 reais por semana. Fez uns três ou quatro gols no período e recorda do centroavante da equipe, Nilzo, um negro de quase um metro e noventa, excelente no cabeceio, que lhe disse certa vez: "Gaúcho, se eu chutasse com os dois pés, como tu, estaria na seleção".

 

Esse breve período teve ainda algumas outras histórias, como a de Mirian, abandonada com o filho ainda bebê no hotel pelo marido e que os rapazes apoiaram, mas são assunto pra uma outra crônica. Pedro, Zé Carlos e Irani, nesses arroubos da juventude, cansaram da aventura, desistiram de São Paulo e resolveram voltar pra Charqueadas, onde estavam suas namoradas. E foi essa a minha conversa com Pedro na viagem e enquanto assistíamos o seu ex-clube vencer por 2x1 o Grêmio, seu time do coração.

 

Torcedores que estavam nas cadeiras do gramado oeste bradavam furiosos contra o time e Renato, reclamando por sua demissão. Devem gostar de série B, pelo visto. Esqueceram os erros de 2021, do troca-troca de treinadores? Alguns torcedores jovens (e outros nem tão) parecem crianças mimadas, se não tem o que querem na hora, esbravejam colericamente, sem maiores critérios, reflexões ou bom senso. Herdeiros daqueles corneteiros da social do Olímpico. O que vi foi um Criciúma jogando muita bola, principalmente o camisa 2, pela direita. Time bem fechado e partindo no contra golpe. Bom, aquele segundo gol deles foi algo que poderia ter sido evitado, assim como o terceiro do Atlético Mineiro, semanas antes. Dois empates teriam sido resultados justos e o Grêmio estaria com 33 pontos agora.

 

Pra mim e pro Pedro, contudo, foi uma excelente noite. Nos divertimos pra caramba, ontem. "A vida, pra uns, é ideal; pra outros , desespero" - Cecílio Rocha.