Meu defeito
Recentemente, em uma entrevista de emprego, foi perguntado a João 6x1 qual era seu maior defeito. João falou que era ser João 6x1. A entrevistadora ficou sem entender o que João quis dizer. Pediu que João detalhasse objetivamente. João explicou: "É o seguinte, minha senhora: eu sou João 6x1. Trabalho 6 dias, folgo 1. Impreterivelmente às terças-feiras. Esse é meu maior defeito".
A entrevistadora sorriu um pouco, olhou nos olhos negros de João e chamou o próximo de sua extensa lista.
João, é claro, não passou na entrevista de emprego, porque João 6x1 é um garçom muito sincero para os padrões atuais. Exemplo: certo dia, uma cliente sentou-se à mesa e, no meio do consumo, chamou João 6x1 e lhe disse que ele trabalhava muito sério. João respondeu: "Esse é meu jeitinho, minha senhora". A senhora não gostou do jeitinho de João, chamou o gerente, e foi assim que João deixou de ser João 6x1.
Eu, evidentemente, não sou João 6x1. Também não sou garçom barístico, muito menos sincero, é claro, mas, a par disso, tenho comigo, inclusive, meus defeitos, é claro. Porque, defeitos, como diz Machado de Assis, melhor tê-los. Enfim, talvez "defeitos" não seja a palavra certa. É muito pesada, não é? Portanto, prefiro chamá-los de "características avançadas".
É isto: sou um sujeito com características avançadas, e cá estou eu, caminhando, por aí ou aqui, com essas pequenas particularidades. Mas, é claro, essas qualidades que quase nem noto, quase nem vejo. Porque estou quase integralmente ocupado com os defeitos dos outros, que essas pequenas falhas me passam despercebidas, como se fossem um pontinho em uma pintura impressionista.
Portanto, ATENÇÃO: prepare-se, porque estou prestes a revelar um dos grandes mistérios da humanidade: o meu defeito. Aquele detalhe que a ciência ainda não conseguiu decifrar, mas que, nas entrelinhas da minha existência, insiste em aparecer nos momentos mais inoportunos.
Então, esses dias, lá estava eu, sentado, refletindo sobre a vida – algo como um filósofo de boteco sem o boteco – quando, de repente, Eureka! Percebi algo: um defeito meu. Uma peculiaridade tão charmosa, que me torna único e incompreendido, a exemplo de uma obra de arte moderna que ninguém entende, mas todo mundo finge admirar.
E lá estava eu, sentado, caminhando por aí, com essas pequenas particularidades. Foi então, nesse momento de descaminho, que me apareceu João 6x1, com sua alegria séria, como de costume, para me perguntar se eu queria outra. Estava tão desligado, que não entendi o que João quis dizer com "outra".
– Outra, João? Não. NATASHA basta.
João 6x1, em sua jornada 6x1, com seu jeitinho alegremente sério, em seu terno impecavelmente branco, embora tão focado em sua jornada 6x1, para ele, seu maior defeito, pareceu me entender. E isso me afligiu. Seria João, por acaso, uma dessas pessoas que gostam de espiar a alma dos outros com lupa? Seria esse mais um de seus defeitos? Seria João, também, um desvairado?
Pareceu-me óbvio que não. João 6x1 pareceu-me normal. Porém, ficam as dúvidas: será que João 6x1 também sofre de reflexão contínua? Busca, quase obsessivamente, entender o que está dentro e fora, sem saber dos quês e por quês? Será que João também conhece NATASHA? Ou será João 6x1 apenas mais um garçom alegremente sério?
Enfim, como diz mais de uma vez Machado de Assis, vai-se o homem, ficam as dívidas, fica NATASHA, é claro, nosso maior defeito.