A REVOLTA NO PAÍS IRREVOLTÁVEL

Era um país historicamente pacato da América do Sul. Com custo de vida nas alturas, algumas de suas partes eram destino preferido de bilionários do planeta, ávidos por exibir depois as fotos esquiando. Foi o local escolhido para sediar importante evento da área de incansável fôlego para vasculhar cantos da mente sabe-lá-atrás-do-que. E lá foi a mocinha se embrenhar na primeira investida fora dos limites territoriais do seu país. O roteiro de uma semana era quase todo preenchido por atividades, com destaque da sua apresentação. Primeiro dia, ok. Segundo dia, ok. O terceiro dia acordou entre tiros, tanques e confusão por todo lado. A filha do presidente, como toda menina, teve uma adolescência um tanto atribulada, recheada de trovoadas por todo o lado, especialmente com o pai, coitado desse pai. Não tinha dia em que o pau não fosse quebrado em casa, tanto que pensou centenas de vezes em abdicar da paternidade, caso fosse possível. Essa outra mocinha, já arranhando os 30 anos, despertou disposta a ser a manda-chuva do então pacato país. Dizem que foi articulando um golpe por mais de 15 anos, arregimentando cúmplices fazendo uso da sua privilegiada retórica. Mandou ver na fatídica terceira manhã do evento. Botou logo o presidente e pai na cadeia, que demorou umas duas horas até entender o que acontecia, pois beirava os 67 anos e já dava profundos sinais de gaguisse. A mãe até tentou dissuadir a filha, mas acabou achando mais prático se aliar a ela e tirar proveito da situação. O irmão mais velho, que tinha se exilado em país vizinho e ficava diuturnamente querendo saber quem nasceu antes, o ovo ou a galinha, veio às pressas e foi nocauteado em segundos, babaus. Ela se autoproclamou rainha vitalícia por 5 gerações, o que a imprensa internacional rotulou como por demais pretensiosa, depois de deflagrada uma guerra interna generalizada, dizimando opositores e transformando o país numa Gaza elevada à décima potência. Aquela primeira mocinha ficou escondida na cozinha do hostel em que havia se hospedado, desesperada com a algazarra que açoitava seus ouvidos para lá de sensíveis, se entupindo de massa de fazer empanadas, especialidade do lugar. Pensou até em pedir ao pai para vir buscá-la, mas lembrou dos entreveros com o velho e ficou com certo constrangimento. Não sabemos bem o final dessa história. Parece que se apaixonou por um dos guardas da rebelião e foram viver um conto-de-fadas numa enorme propriedade rural no Reino Unido, herdada de um primo distante. Tiveram 8 filhos que eram uma belezura, cada um mais tchutchuca do que o outro. Que o pai, de longe, admirava com certo pesar, pois ser avô sempre foi o maior sonho de sua vida.

Oscar Silbiger
Enviado por Oscar Silbiger em 11/09/2024
Reeditado em 11/09/2024
Código do texto: T8148815
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