SAUDADES DELA

Ouvindo às lágrimas a música " Debaixo dos caracóis ", de Roberto Carlos, angustiado por não conseguir conversar com minha noiva, morrendo de saudades dela, sozinho nos confins do Brasil, ainda mais sob o peso tirânico da perseguição desmotivada movida contra mim pelo subgerente da agência onde eu trabalhava, a única saída era escrever, chorar, pensar em chutar o balde, mandar tudo às favas e voltar para minha terra, família, amigos e minha amada.

Mas fugia de mim a lógica entre o querer e o poder, largar o sonho de um emprego estável pelas ilusões quimericas de um retorno covarde jamais poderia fazer parte dos meus anelos. A única e possível solução a meu dispor parecia ser simplesmente suportar as saudades, aceitar a solidão e permanecer calado ante o ódio do meu superior, engolindo tudo isso em seco no continuar da jornada.

O aglomerado de amarguras cobrava seu alto preço na minha já debilitada saúde, que o cotidiano diluia ainda mais. Foram dias, meses e anos difíceis, sem amigos, amor, carinho, essas coisas que dão à vida o melhor tempero, principalmente sendo eu um romântico inveterado amante da poesia, dos luares, dos pores do sol, desejando namorar de mãos dadas por aí, nas ruas e praças e trocar beijos apaixonados com a mulher amada. Malgrado o tormento, regressar derrotado nunca!

Os sacrifícios de trabalhar dois expedientes, estudar à noite e, após as aulas, noite alta e até bem tarde, quebrar a cabeça aprendendo as matérias do concurso público do Banco do Brasil, mormente matemática financeira com suas multiplas dificuldades, língua portuguesa cheia de armadilhas complicadas, conhecimento geral, geografia, psicologia, além de nos fins de semana fazer aulas de datilografia para a prova final e estafante de escrever um texto com novecentos toques sem erros nem omissões de palavras, não deveria ser em vão.

Enfrentei tamanhas barreiras íngremes, ultrapassei os obstáculos de sol a sol, pisei nas pedras pontiagudas, suportei tudo com vistas a obter a aprovação na disputa até lograr o ansiado sucesso. Passei, ganhei, venci, graças a Deus! Apenas não sabia que tinha dado o primeiro passo. Ser nomeado para o distante à época Território do Amapá, afastar-me da família, da terra onde nasci, de amigos, conhecidos e colegas e de minha namorada foram as subsequentes passadas mais dolorosas que precisei dar.

E ali me encontrava eu, longe, muito longe de todos, escutando o cancioneiro popular e me derretendo em pranto por causa da saudade, da solidão e da carência que sentia de minha garota. Porém nem pensar em jogar para o alto as lutas, o cansaço, os esforços e, por fim a vitória alcançada. As novas atribulações também seriam vencidas, eu as derrotaria mesmo à custa de muito desgaste, chorando e cantando, esmurrando as paredes, batalhando contra gigantes, apanhando mais que reagindo, mas disposto a terminar a jornada.

O sangue derramando no trajeto testemunharia o denodo de meu empenho, minha força de vontade de seguir ainda que me arrastando no chão áspero da estrada. O amor deixado para trás esmoreceu, conquistei nova musa inspiradora, derrubei o rancor e a ira de quem pretendia pisar sobre mim, batalhei o bom combate, guardei a fé enquanto preparava o espírito para sair do Amapá de volta às minhas origens, então por fim saí vitorioso e tudo de ruim ficou no pretérito.

Gilbamar de Oliveira Bezerra
Enviado por Gilbamar de Oliveira Bezerra em 09/09/2024
Reeditado em 13/09/2024
Código do texto: T8147544
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