Boa Noite Cinderela

Quando seu Raimundo chegou em sua casa. Cansado da labuta, ele procurou na garrafa de bebida, prima da cicuta, qualquer coisa pra lhe sombrear as feridas da miséria de vida. Pois que,  sob sol pesado de cada dia, ele construtor, viúvo que a saudade consumia, a duras penas reconstruía sua família.

No legado que ardia, pagava aluguel,  dava de comer, vestia e calçava ao seu tesouro, sua única filha.

Quando de um único sol, que brilha a bons e maus, sem qualquer julgamento veio a ele com lamentos, um dos seus irmãos,

Que usando de sofrimentos, como argumento , pediu-lhe agasalho.

Sem ter o que fazer, apesar dos tormentos pessoais pensou em ajudar, pra quem sabe receber no futuro.

Logo pensou, que seria uma força a mais,  alguém pra dividir as despesas  da mesa, bem como o convivio social.

Quando o mesmo sol de cada dia se fez, a expectativa  produziu a esperança, que a realidade  transformou em ansiedade.

Acontece que na rua sem saida, que no fundo do poço, quem dispõe de coragem, ouve a voz da resiliencia. E assim Manoel, impulsionado por Raimundo encontrou na vigilância dos predios da capital o seu sustento.

Com o tempo, correndo contra o vento, a filha de Raimundo acendendo em beleza na escuridão, foi logo notada pelo tio Manuel.

Nesse meio vão, a filha chamava a atenção, que o pai, ainda cego, só enxergava a criança sem noção.

Nos muitos invernos e verões, o tio começou as suas incursões, assediando a menina, que com medo da reação do pai nada dizia.

Como água mole em pedra dura, tanto bate até que fura.Manuel, numa hora de qualquer momento violentou a menina.

Violentou inumeras vezes com ameaças, que soam como prisões.

Até cansada e enojada da situação,  ela saiu de sua introspectiva solidão e falou ao seu pai, que não acreditou.

Convivenfo com a dor, chegou a hora, que ela debutou.

Nos seus quinze anos, onde três se via como bandida, não mais aguentou e decidindo por si,  abandonou a sua casa.

Foi morar na rua, onde se sentiu segura, onde não teria seu corpo mutilado, pois tinha conciencia das novas ordens.

Lá aprendeu mais do que a lei da caça, mas não se importou. Conheceu muitas pessoas, trocou seu corpo, tatuou de amarguras a alma, conheceu os traficantes, que lhes apresentaram as drogas.

Num frio amargo de São Paulo, aquela princesa sem castelo, aquela celebridade sem seguidores, aquela pessoa, num dos cantos da Santa Efigênia, num ensolarado dia não amanheceu.