Natural
Natural (José Carlos de Bom Sucesso – Academia Lavrense de Letras)
O relógio marcava algo em torno de quatorze horas daquele dia nublado. O sol aparecia de forma menos brilhante e nuvens cobriam o azul celeste com cortinas negras.
O poeta, longe de sua casa, sentado debaixo da grande árvore de ipê, observava com muita cautela as lindas e maravilhosas flores amarelas presas nos galhos daquela imensa árvore.
Ao redor, pássaros faziam e cantavam a mais expressiva sinfonia. Maritacas solfejavam altas notas musicais. Tico-ticos aventuravam-se a passear nas folhas secas caídas da nobre árvore, florescida da mais esplêndida flor amarela.
Pequenos insetos voavam de um lado para outro lado, na mais perfeita harmonia natural.
A cantarola dos pássaros era interrompida com as rajadas do vento, que balançavam galhos de outras árvores ao redor da praça onde o bardo observava calmamente o que acontecia, pois daria o mais sublime verso que procurava.
Até mesmo o beija-flor aventurava seu beijo a cada uma flor ali presente, mas, pela pequena estrutura, as rajadas de vento o tiravam do objetivo.
Algumas formigas subiam e desciam do tronco, porém cautelosas pelos inimigos naturais.
Assim, o sonhador pensava que os versos que procurava estavam ali, bem perto dele, junto à natureza que lhe dizia algo tão belo, tão imaginativo, tão puro quanto à alma frágil e doce do sábio.
Ouviu-se o grande estrondo do trovão, que dizia que a primavera estava iniciando. Por certo, em pouco tempo, as rajadas de vento transformariam em correntes de ar que fazem as gotas da chuva espalharem por toda aquela imensidão tão seca, tão lúgubre, que jamais daria algum cenário para o melhor verso, quem sabe a melhor ideia do momento.
É final de agosto e ainda alguém nem mesmo se lembrou da terra seca, da terra escaldante e sem vida, onde tudo é de cor diferente, de cor mais clara, de cor pronta para ser derretida nas chamas do fogo destruidor vindo de algum incêndio criminoso.
Então, o poeta se retira calmamente para seu lar. Ao se levantar, ele ainda olha para a árvore toda vestida de amarela, pois dali a alguns dias, aquela amarela cor de ouro estará caída no sombrio chão, já sem vida, como bagaço espremido das máquinas de produção de sucos. É final de inverno e em alguns dias futuros o inverno dará lugar à primavera, a estação das flores, a estação da vida, a estação das belezas naturais.