QUAL É MESMO O NOME DELE?

— Lá vem ele, cabelinho cortado na régua, penteado pro lado, gravatinha vermelha, tá alinhado o homem, barbinha feita. E o celular fazendo volume no bolso... pelo tamanho deve ser dos bons, olha a roupa, novinha, deve ser de alguma marca famosa, no mínimo, esse povo nunca anda desarrumado. Olha só a cara de pau do sujeito... O sorriso de orelha a orelha, como pôde! É sempre assim, esse povo nunca muda, será possível que algum dia vai ser diferente? Sinceramente, não sei nem o que dizer. Olha só... Até o jeito do cidadão andar é diferente, parece que tá pisando em ovo.

— Qual é mesmo o nome dele?

— Eu é que sei... Quase nunca vejo ele por aqui, é só na época de eleição que esse sujeito aparece. Outro dia a Dona Lurdes, sabe, dona Lurdes, casada com seu Geraldo, lá da rua debaixo, então, ela disse que ele mora lá perto do final da avenida, naquele condomínio bonito, fechado, cheio de casarão ...

— Ah sim! Sei qual é, condomínio dos pássaros ... Minha irmã trabalhou lá por uns tempos como diarista, fez serviços nas casas das madames, de repente, até trabalhou na casa dele. Vai saber. Qual é mesmo o nome do sujeito?

— Mulher! Eu não te falei que não sei. Eu só vejo esse cidadão na época da eleição. Daí ele aparece, até na igreja vai, no culto, nas missas, só você vendo.

— Ele já foi lá na sua igreja?

— Eu não tô dizendo, foi no culto do domingo, o pastor Claudinho ainda colocou lá junto com os obreiros. Só você vendo, cantava, levanta a mão que é uma beleza, mais é só terminar a eleição que desaparece.

— Lá vem, conversa você com ele, eu tenho vergonha.

— Sempre pra mim que sobra né, também, que hora errada pra gente querer varrer a calçada...

— Bom dia senhoras. Tudo bem com as senhoritas...

Sorriso de orelha a orelha, o candidato cumprimenta, coloca as mão no ombro de uma das senhoras, como se fosse um amigo de longas datas.

— Bom dia ...

Responde meio a contragosto, se incomoda com a mão no ombro, enquanto a outra toma distância disfarçadamente.

— Deixa eu me apresentar. Primeiramente, perdoe-me por tomar o precioso tempo de vocês, não quero atrapalhar. Eu sou o Edinho, candidato a vereador aqui do bairro, tô apoiando o prefeito na eleição, moro ali mesmo, no final da avenida. Eu tenho uns projetos novos para nosso bairro. Vamos implementar um posto policial no começo da avenida, que vai atender, além do nosso bairro, outros também. Vamos revigorar o postinho. Também estou com um projeto para causas animais, tem muitos animais soltos pela cidade. Como sou veterinário, tenho um cuidado especial com os animais, enfim, para não tomar mais tempo das senhoras. Agradeço a atenção, não esqueça da gente. Tenham um bom dia, Deus abençoe, não esqueça do Edinho.

O vereador deixa os famosos santinhos, uma porção deles, acena para quem passa. Deixa as duas senhoras e continua sua peregrinação pelo bairro, sorriso de orelha a orelha. Nem bem se afastou, as duas senhoras continuaram na conversa.

— Olha aí, eu não te falei Irene, é sempre a mesma coisa.... "Eu vou fazer isso, aquilo, não sei o que, blá, blá, blá"... Depois você nem vê a cara do sujeito. "Tenho um cuidado especial com os animais" , mais é só o que me faltava...

— Mulher! Fala baixo! Vai que ele escuta.

— É pra escutar mesmo, lá vai ele, direto no bar do português, agora deu..

— É assim que funciona, o camarada paga uma cerveja aqui, um churrasco acolá, e todo mundo se entope na cachaça. O povo não toma jeito ...

— Olha amiga, o papo tá bom, mas tenho que entrar, meu almoço tá atrasado, daqui a pouco os meninos chegam da escola, e você já viu né.

— Eu também vou entrar antes que apareça outro desses papagaios pra buzinar na minha orelha. Até mais tarde Juraci, fala pra Katia que deixei um abraço.

— Pode deixar amiga, ela vai gostar de saber.

Tiago Macedo Pena
Enviado por Tiago Macedo Pena em 01/09/2024
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