Dei em terras paraguaias
Fui apresentado à família Cruz por José Alexandre Saraiva, conforme contei na crônica "O Guarda-chuva do Saraiva", publicada neste Recanto das Letras e incluída no meu livro Vago-Mundo, Editora Caravana, Belo Horizonte, 2022. A casa da família Cruz passou a ser a minha segunda casa em Foz do Iguaçu. Tinha gente alegre, acolhimento e, além de tudo, música. Lembrava muito o ambiente que tinha em Pitangui, na casa do Jonba, o João Batista de Freitas, um dos meus parceiros musicais.
O chefe da família, o mineirinho Osmar José da Cruz, falecido em 02/06/2024, além de músico versátil, era exímio contador de piadas. Isso também nos aproximou: sou ótimo ouvinte e apenas razoável contador. A esposa, Irene, os filhos Edson, Sílvia e os gêmeos José e João Paulo, todos músicos, faziam a festa, sem precisar de apoio externo. Claro, porém, que músico atrai músico e, quase sempre a casa tinha um ou mais instrumentistas ou vocalistas para agregar valor.
Uma das canções do extenso repertório do Osmar era o "Cuitelinho". Essa composição, de Paulo Vanzolini e Antônio Carlos Xandó, chamada por alguns de "hino caipira", foi gravada por artistas como Milton Nascimento, Nara Leão, Pena Branca e Xavantinho, Sérgio Reis, Renato Teixeira e vários outros. Parece que Osmar já a havia cantado tantas vezes que não se ligava nunca ao inevitável duplo sentido, aproveitado por qualquer integrante tardio da famosa "quinta série". Refiro-me ao trecho que diz "dei em terras paraguaias".
Quando foi entrevistado no nosso podcast, o internacionalmente famoso "Qual é a Sua?", levou um violão e anunciou que cantaria "Cuitelinho" no final. Essa entrevista tratava de sua vinda do norte de Minas para o Paraná, aos 12 anos de idade, a criação da família, sua profissão de fotógrafo e outras peripécias de sua vida por aqui. Edson, o filho mais velho, participaria do programa.
Ficamos tensos quanto à solução que pretendia dar ao trecho da música mencionado. Já havíamos feito muita brincadeira com isso nas cantorias caseiras. Chegado o momento, olhou-nos com um sorriso maroto, se atrapalhou um pouco, porém, sem perder ritmo e tom, substituiu o "dei em terras paraguaias" por "fui em terras paraguaias". E completou, depois do programa, também marotamente:
- Troquei a letra naquele pedacinho sem medo... Essa música já é de domínio popular.
Grande Osmar, saudades enormes!