Entre passos e pausas
Ela sempre foi movida pela energia do movimento. Para ela, a vida pulsava nas corridas matinais, no suor que escorria pelo rosto, no vento que batia no seu cabelo enquanto ela disparava pelas ruas do bairro. Era o barulho dos tênis tocando o asfalto, o som ritmado de sua respiração, o prazer de sentir o coração bater forte no peito. Os amigos diziam que ela parecia dançar, mesmo quando corria. Era feliz assim, com os pés na pista e a cabeça no futuro.
Até conhecer Ele.
Ele era o oposto. Não era só a falta de disposição para acordar cedo e correr ao ar livre. Para ele, a ideia de fazer exercício era tão convidativa quanto assistir a um documentário sobre o cultivo de batatas. Ele gostava mesmo era do aconchego do sofá, de maratonar séries, e de uma boa porção de batata frita. Sua vida era feita de pausas, intervalos longos, e ele nunca teve pressa de chegar a lugar nenhum.
Quando se encontraram pela primeira vez, ela estava suada, ofegante, voltando de uma corrida no parque. Ele estava saindo de uma lanchonete, uma porção de pastel na mão e um sorriso tranquilo no rosto. A faísca entre os dois foi instantânea e inexplicável. Ele a convidou para dividir um pastel, e ela, sem pensar muito, aceitou. Ali, sentados no banco da praça, cada um em seu próprio mundo, riram juntos pela primeira vez.
Eles eram como o sol e a lua, como a água e o fogo. E talvez fosse exatamente isso que os atraía tanto. Quando estavam juntos, algo mágico acontecia. Ele, de repente, se pegava querendo acordar cedo para acompanhar ela em suas corridas, mesmo que soubesse que ia se cansar no segundo quilômetro. E ela, quando estava ao lado dele, descobria o prazer de não fazer nada, de comer besteiras sem culpa, de assistir a filmes ruins e rir sem motivo.
A vida deles se transformou num vai e vem de encontros e desencontros. Ora, ele se esforçava para entrar no ritmo dela, e até se inscreveu numa corrida de rua — e quase morreu de cansaço no meio do percurso. Ora, ela deixava de lado a rigidez da dieta e saía com ele para comer pizza e tomar sorvete. Eles não eram perfeitos, e talvez nunca seriam. Mas havia algo de especial na forma como se completavam, mesmo nas diferenças.
Mas as diferenças, inevitavelmente, também traziam dificuldades. Nas idas e vindas, acabaram por se afastar algumas vezes, cada um voltando para seu próprio universo, questionando se aquilo realmente podia dar certo. Quando se encontravam, havia sempre uma incerteza no ar, uma dúvida se aquele seria o último beijo, o último abraço. Mas era também essa incerteza que fazia cada momento ser vivido com uma intensidade única, como se fosse a última vez.
Hoje, mais uma vez, eles se encontraram na praça onde tudo começou. Ele, com seu jeito despreocupado, oferece a ela um pastel, como quem pede desculpas, como quem diz que ainda está ali. Ela sorri, aceita o pastel, e eles se sentam no banco, lado a lado, como se nada tivesse mudado, como se o tempo tivesse parado só para eles.
Eles não sabem o que o futuro reserva, nem se vão conseguir encontrar um meio-termo onde suas vidas possam se encaixar sem tantas idas e vindas. Mas, naquele momento, o importante é que estão juntos, compartilhando um pastel e uma risada, sentindo que, de alguma forma, apesar de todas as diferenças, há algo que sempre os une.
E, talvez, seja exatamente isso que importe. Viver o agora, sem pressa, sem garantias. Porque a vida, afinal, é feita de passos e pausas, de correr e parar, de ir e voltar. E enquanto eles tiverem um ao outro, sabem que, de alguma forma, sempre haverá um novo encontro à espera.