Insônia
É engraçado como a insônia mexe com o tempo. A noite, que normalmente é tranquila e feita para descansar, vira uma eternidade. Cada minuto parece se esticar, como um elástico que não quer mais voltar ao lugar. E não é só o fato de não conseguir dormir. É ficar acordado e ver cada pensamento que a gente tenta evitar durante o dia ganhando vida própria.
A insônia é como aquele amigo que aparece sem ser chamado, sem aviso, sempre nas piores horas. Ela se instala no quarto, nos olhos que não querem fechar, na cabeça que não desliga. E, de repente, a gente se vê ali, deitado na cama, olhando para o teto, pro escuro, pro nada. É como se a gente estivesse num cinema vendo um filme sobre a nossa vida — só que esse filme é feito de lembranças, preocupações, sonhos que ficaram para trás e escolhas que a gente não teve coragem de fazer.
Eu me lembro das noites quando era criança. O sono vinha fácil, como um carinho. Não havia tanta coisa para pensar, o mundo era simples. O maior medo era o escuro debaixo da cama ou um barulho estranho vindo do corredor. Insônia era uma palavra que eu nem conhecia, algo que parecia só existir para os adultos.
Aí a gente cresce. E com a vida adulta vêm todas as responsabilidades: contas para pagar, pessoas para cuidar, o peso dos amores que foram embora, das oportunidades perdidas. A insônia, agora, é a soma de todas as nossas decisões, sejam elas boas ou ruins. É aquele "e se...?" que fica martelando na cabeça, é o arrependimento pelo que a gente não disse, pelo que a gente não fez.
Tem noites em que a insônia é como aquele amigo antigo que sumiu e, de repente, reaparece. Ela traz com ela histórias do passado, lembranças de tempos mais leves, e também um certo desconforto de saber que a gente não é mais o mesmo, que as coisas mudaram. E aí ficamos ali, contando as rachaduras no teto ou ouvindo o tic-tac do relógio, como se o tempo estivesse rindo da nossa cara.
E tem aquelas noites em que a insônia vira um espelho, mostrando pra gente não o rosto que mostramos pros outros, mas aquele que escondemos até de nós mesmos. De repente, somos obrigados a encarar nossas fraquezas, nossos medos, nossos arrependimentos. A insônia nos deixa sem máscaras, nos expõe. Ela é o silêncio que fala mais alto do que qualquer palavra, é a sensação de estar sozinho mesmo quando a casa está cheia.
Mas, por mais que a insônia seja difícil, talvez ela também seja um lembrete de que estamos vivos. Porque só quem sente, só quem se importa, só quem ainda tem sonhos é que perde o sono. É uma prova de que nosso coração ainda bate, de que nossa cabeça ainda pensa, de que nossa alma ainda quer alguma coisa.
Então, talvez, da próxima vez que a insônia aparecer, a gente deva recebê-la como um velho conhecido, ouvir o que ela tem a dizer, tentar aprender alguma coisa. Porque, no fim das contas, a insônia é só mais uma parte do caminho, um jeito de lembrar que, mesmo nas noites mais longas, sempre tem um novo dia esperando pela gente.