pequenas reflexões
Quantas vozes, quantas vozes no mundo virtual, cheias de certezas, cheias de afirmações sobre o que somos e sobre como se deve caminhar por esse mundo! Vozes que me dizem que a vida passa enquanto apenas cozinho, limpo a casa, dou comida para as gatas. Assim vão-se os dias sem nenhuma epifania. Nenhuma mudança radical, nem no comprtamento nem nos afazeres. Não vislumbro o Deus oculto nessa rotina pagã. Não tenho certeza de que subirei aos céus após a morte, tocada pela plena sabedoria que os mestres espalhados no YouTube me apontam. A sensação é que a vida é tão grande e espera tanto de mim, que nunca vou conseguir dormir com o conforto da plenitude. Falta tanto, falta tudo, e esqueço de buscar esse tudo nos dias que se apresentam quentes e enfumaçados, escondendo muito mais ameaças que promessas. Vou atravessando-os, repetindo gestos, porque, afinal, é o que sou: cotidiana, simples, humana. Às vezes tenho desgosto de ser só isso: um ser humano de lacunas e faltas. Com fome, sede, preguiça, raiva, decepção. Sentindo-me às vezes algoz, às vezes vítima. Com medo da dor, do desconhecido, da morte. Amanhã, apesar da sapiência dos filósofos e dos mestres, eu levantarei cedo, farei minhas preces, o café, e sairei de dentro de mim para mais um domingo onde existir será cumprir a lida de sempre. Todavia, haverá um vento a estremecer cortinas; um pássaro no telhado chamando a atenção para sua inusitada presença;um lampejo de graça descendo sobre o mundo que só eu vou ver, e recolher ao coração, como um pequeno tesouro para carregar comigo, quando os outonos vierem.