Ver de fantasma

14:35

As imagens se inventam cada vez que as olho. Meu corpo é chumbo.

15:29

A semana mal começou. As coisas são compridas, longe distantes. Cada vez mais me sinto um átomo, cada vez mais me sinto um pouco menos você.

Penso que te vi, mas acho, foi coisa da minha cabeça, um ver de fantasma. Não. Não. Você existe e reaparece, de costas. Se afasta com um vestido azul, com leveza nos pés

Começo a passar mal e a suar, e a fugir me esgueirando entre as lojas, como se, dos meus poros, escorresse um grito de eu te amo.

Desnorteado, eu sinto que vou desmaiar. Pego minhas coisas, pego minha caneta e esse caderninho que escrevo agora, vou embora rezando pra não te ver. Rezando, na verdade, pra te ver e te abraçar.

15:55

Entro em um café, peço algo, peço a coisa mais doce que consigo ver, peço por você. O garçom não entende o que eu digo, garçons falam a língua do amor?

Enquanto espero o café chegar e tento respirar, eu penso sobre a náusea que é querer. Estou tonto, talvez seja a rotina ruim, talvez eu esteja só me alimentando mal, talvez. Talvez amanhã passe, talvez. Amor não mata a sede, mas arrebata, alimenta, sem parar, os desejos.

18:45

Estanco o choro, as luzes brilham, o invisível estala e cresce. Me sinto feliz. Feliz porque, mesmo na dor, sentir as coisas ainda é bom. Feliz porque amar ainda é melhor do que não amar.

19:24

Me movo rápido, seu corpo é uma lâmina brilhando no fogo. É noite, volto pra casa, estou descendo do ônibus, estou debaixo do chuveiro, me atiro em água fria e limpa, tenho sede em ser paz.