INTOXICAÇÃO DIGITAL

Outro dia fiquei me perguntando o porquê dessa necessidade de reservar tanto tempo se atualizando com notícias nacionais e internacionais. A ficha caiu de repente, quando li e ouvi aquele lema da Globonews, que se propõe a não desligar nunca, mesmo que para isso seja necessário repetir notícias ao longo do dia.

Hoje se tornou uma prática comum aquela postura envergada, antes restrita aos idosos, agora demonstra uma devoção sem parâmetros de dedicação ao que ocorre na telinha iluminada dos celulares.

Não importa por onde você circule, esse tipo de contaminação se expandiu, poupando apenas uma parcela da população idosa, função da inadequação, seja no traquejo com esse computadorzinho, seja por deficiência visual ou de habilidades manuais de sintonia fina.

Agora ficamos expostos a problemas sérios, principalmente quando passivos assistimos a pedestres, ciclistas, ou motoristas desviando sua atenção para a telinha viciante, mesmo em movimento.

Algumas profissões que antes exigiam preparo adicional contra a inércia da monotonia, função da utilização exclusiva da habilidade visual, e às vezes, apenas produzir rápidas inflexões monossilábicas com moradores mais educados.

Agora, tornou-se normal passarmos diante não apenas de porteiros em serviço, mas também de policiais, completamente distraídos pelo canto hipnótico da telinha brilhante.

A antiga solidão em meio a tanta gente, comum a passageiros do transporte público, essa então foi eliminada de vez, agora introspectos e entretidos com seus celulares, muitas vezes perdem até a estação de descida.

Quando levamos estas situações ao extremo, e isso acontece sem que as pessoas percebam, pronto, estamos diante do típico sintoma de intoxicação informacional, mais evidente ainda, quando no momento dedicado ao almoço, torna-se comum, mesmo numa mesa de colegas de trabalho, ou entre parentes a interação acontecer apenas entre homem e máquina, relegando ao segundo plano aquela célebre frase do poetinha, que louvava como poucos a arte do encontro, num mundo de desencontros.

Muita gente sem perceber deixa de cumprir seu papel, distraída com atrativos oferecidos por essa droguinha disfarçada, que claro, lhe permite tantas possibilidades, fico imaginando o que deve estar acontecendo na cabeça dos mais jovens, que por não terem ainda desenvolvido filtros, imagino, estejam muito mais suscetíveis aos efeitos danosos dessa maquininha que encanta gregos e troianos.

E as fake news, vieram mesmo para infernizar a vida das pessoas comum, incapazes de discernir a diferença entre o joio e o trigo, acabam ingerindo informações estragadas, e o pior servindo de agente propagador de mentiras sem o saber.

Levando em consideração toda essa maluquice sem freios imposta pelos celulares, as empresas visando reduzir mão de obra, implantam indiscriminadamente aplicativos para tudo, e lá vai você pendurar mais um deles no celular, enquanto outros meios vão ficando cada vez mais raros, e quando ainda disponibilizados, exigem do cliente uma paciência de Jó, ouvindo repetidamente desagradáveis gravações, que insistentemente indicam que a melhor opção de atendimento é por seu aplicativo, enquanto você indefeso, aguarda o momento de finalmente ser atendido, isso se a ligação não cair, ou for caída propositadamente.

Os melhores exemplos para sintetizar tudo que foi dito, acontece quando por algum motivo, você resolve cancelar um serviço, não importa de que, a via crucis digital aguarda você, com propostas às vezes indecorosas, como reduzir o custo anterior pela metade, ou mesmo criar um labirinto de protocolos, para que algum procedimento dê errado, te fazendo retornar a estaca zero.

E o pior disso tudo, é que supostamente tudo que foi elaborado, pelo menos no discurso oficial, visa simplificar sua vida, dispensando seu deslocamento até uma agência física, aliás, uma entidade em fase final do processo de extinção.

Seja bem vindo ao mundo digital à brasileira!

Alcides José de Carvalho Carneiro
Enviado por Alcides José de Carvalho Carneiro em 16/08/2024
Código do texto: T8130010
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