Um pé de cana

 

Eu tenho um pé de cana (dizemos apenas cana, mas é cana-de-açúcar). Rubem Braga tinha um pé de milho, sobre o qual escreveu a crônica “Um pé de milho”, de dezembro de 1945, crônica que, com outras, virou o livro Um pé de milho, publicado em 1948 e reeditado várias vezes até hoje. Salvo engano, a edição mais recente é a de 30 de outubro de 2019, pela Global Editora. Como se vê, uma simples crônica, que, por sinal, tem trezentas e sessenta e duas palavras, incluídas as quatro do título e as duas do nome do autor, virou página imortal da literatura brasileira.

 

Outro literato famoso, Humberto de Campos, da Academia Brasileira de Letras, tinha um pé de caju, que, ainda criança, plantou em 1896, na cidade de Parnaíba, Piauí. Que eu saiba, não virou livro, mas continua sendo cantado em prosa e verso, além de, apesar dos seus cento e vinte oito anos, continuar vivo e lindamente viçoso. Tenho uma foto dele, tirada em 4 de fevereiro de 2023, pela Dr.ª Clarissa de Cerqueira Pereira, à época, minha colega de trabalho na Câmara Municipal de Marabá. Foi um gesto carinhoso da minha colega, pois, como eu entusiasticamente já lhe falara desse cajueiro, tirou a foto especialmente para me enviar.

 

Como sabe o leitor, de vez em quando, falo desse pé de caju e desse pé de milho, como fiz, por exemplo, na crônica “É bom ser lembrado por alguém!”. Falo para quem sabe o que é e por isso dá valor. Evidentemente, os que não leem e não gostam de literatura – hoje, infelizmente, a maioria – nem sequer sabem o que é crônica, quanto mais saber quem foram esse tal de Rubem Braga e esse tal de Humberto de Campos. E dessa história de pé de milho e cajueiro, pior ainda. Que pena! Há, porém, os que gostam. Ainda bem!

 

Ninguém duvide. É possível que muitos pensem ou até digam: “Pé de cana, pé de caju, pé de milho. Quanta besteira!” Pois bem, sem problemas. Lembro-os de que bem diz o ditado: “Nunca mostres o teu poema a um não poeta.” E mais. Outro Rubem cronista e famoso, o Rubem Alves, diz, sabiamente, na crônica “As rãs, o pintassilgo e a coruja”, uma das que compõem o seu livro Na morada das palavras: “Só veem as belezas do mundo aqueles que têm belezas dentro de si.” Isso mesmo. Concordo com ele.

 

Não sou famoso, mas meu pé de cana é especial: veio de Conceição do Araguaia, Pará. A Câmelha, minha mulher, ao voltar do III Encontro da Família Pereira, Silva Nonato, realizado em julho de 2024, trouxe um pedaço de cana-de-açúcar de um gomo e dois nós. Foi o Edilson, um primo de lá, que deu uma porção dessa a cada primo e prima presentes ao evento e recomendou que, uma vez em casa, o plantassem, e, no próximo encontro, levem foto de como estiver. Encampei a ideia. Fiz uma muda de cada nó. Uma já nasceu. A outra ainda está enraizando.