Eu sei
- Eu sei.
- Sabe de quê? – disse uma voz aflita.
- De tudo. – disse uma voz grossa.
Com medo de ter seus segredos revelados, Clara se mudou de cidade. Nunca mais conseguiu esquecer daquela voz. O medo de ouvir aquela voz de radialista novamente causava arrepios. Morava sozinha em uma modesta casa no interior. Evitava falar seu nome e não quis mais ter telefone fixo. Sua vida agora resumia em casa-paróquia. Confessava semanalmente e ajudava na paróquia. Durante uma festa da paróquia, conheceu Gabriel. Alto, moreno. Trabalhava ali mesmo num antiquário.
Com um mês de namoro se mudaram para São Paulo, pois Gabriel perdeu o emprego, o antiquário faliu. Antes de se mudar Clara fez questão de se casar na paróquia.
Passado um mês, Clara atende o telefone.
- Eu ainda sei. – disse a mesma voz.
- Me deixa em paz! – disse Clara aterrorizada.
Desliga o telefone e ele toca novamente. Clara finge não escutar. Seu celular toca. Número restrito.
- Alô? – disse com uma voz estremecida.
- Eu sei. – disse aquela voz.
Desligou. Gabriel chegou. Clara se jogou nos braços dele. Mal dormiu aquela noite, preocupada com aquele telefonema. Resolveu ligar para a polícia no dia seguinte.
- Bom dia. – disse Clara.
- Central de denuncias anônimas. Bom Dia. Em que posso ser útil? – disse a atendente.
- É... Que tem uma pessoa me ameaçando por telefone.
- Que tipo de ameaça, senhora? – disse a policial.
- Diz que sabe tudo sobre mim. – disse Clara.
- Por acaso a isso é um trote? A senhora ligou para a polícia, está ciente de estar atrapalhando a ligação de uma pessoa que realmente precisa de ajuda? Tenha um bom dia. – disse a policial nervosa.
Clara não pôde nem se explicar. Decidiu então procurar um detetive particular experiente em casos de ameaças ao telefone, seu nome Dr. Humberto. Pegou um táxi e foi até o endereço anunciado nos classificados. O escritório era no terceiro andar, não tinha elevador teve de ir andando. Cansada, abriu a porta e ouviu:
- Eu sabia. – disse um homem de terno com uma capa virado.
Clara saiu correndo, tropeçou e acordou horas depois no hospital com aquela voz.
- Abra os olhos. – disse a mesma voz.
Clara abriu lentamente os olhos e percebeu que se tratava de Gabriel.
- Eu sabia. – disse Gabriel.
- Então era você. O tempo todo. - disse Clara chorando. – como você conseguiu esconder sua voz por tanto tempo?
- Eu sei de tudo, não adianta mais se esconder, viúva negra.- disse Gabriel mostrando sua carteira de investigador, aliás minha voz é diferente de acordo com minha vontade.
Clara foi presa e condenada a sete anos de prisão pela morte de seu ex-marido Júlio, que tinha assassinado.