VISITANDO O PASSADO

VISITANDO O PASSADO

Hoje resolvi visitar o passado. Chegando lá, as ruínas que o tempo deixou estavam mais acessíveis. Alguém mandou roçar, embora sem cuidados, e me animei a entrar. Mas as lembranças e a saudade correram à minha frente e demorei um pouco a alcançá-las.

Da construção de 1925 pouco restou, senão poucas paredes que teimavam em ficar de pé.

Da casa somente a parede de frente para a Rua e uma parede interna se equilibravam, uma longe da outra, mostrando do quanto era fortes construídas com tijolos maciços. Festas, alegrias, dores e decepções ecoavam no espaço vazio e as lembranças e saudades de gerações se juntavam em orações pelos que ali moraram por tantos anos.

Fui entrando cabisbaixo e pensativo, tudo pela parte traseira, pisando no Mato ainda meio alto, com medo de cobras e outros peçonhentos.

Estava dentro da Venda e nada lembrava o azáfama de entra e sai da freguesia que por ali transitava a procura de "um tudo" desde querosene para os lampiões e lamparinas, até vassouras, chapéus, gêneros alimentícios que eram pesados nas balanças sobre o balcão, a vista do freguês.

E novamente as lembranças e saudades se deram as mãos o oraram pelas pessoas que por ali compraram e venderam, inclusive os carroceiros e suas ajudantes, que vinham de São Pedro, com suas grandes carroças carregadas de trouxas de roupas, e que paravam para descansar e comprar mercadorias e levar para a Colonia de Cima, para suas casas.

O último cômodo a ser pisado era onde funcionava a Escola.

Alí, tanto a Saudade como as lembranças se detiveram me esperando.

Respirei fundo e entramos juntos.

Fiquei parado no centro da sala de aula, onde minha Tia Vitória foi Professora por muitos anos. Meus irmãos menos jovens estudaram ali, assim como seus amigos e parentes.

Nesse ponto as lembranças e saudades eram deles e se multiplicaram à minha volta.

Mirando a parede onde ficava o quadro negro, podia ainda ouvir os soluços e o choro da menininha de 8 anos, que por não saber a lição, ficara de castigo, ajoelhada, de costas para os colegas e de frente para a parede. A Professora dona Filéia era muito rígida com seus alunos e até se utilizava da palmatória nos alunos mais difíceis.

As lembranças de meu irmão primogênito chegaram de sobressalto: Nossa tia Vitória, sua Madrinha, não aliviava nem pra ele. Não soube a lição de tabuada e teve a mão esquentada pela palmatória.

Diziam os mais velhos, que nem a Dona Filéia e nem a tia Vitória "eram flores que se cheirassem" mas, eram eficientíssimas no seu mister.

Outra Professora, as lembranças e saudades me segredaram, era mais amiga.

Era a Dona Elza Menini. Jovenzinha ainda, recém formada, fora designada para auxiliar Tia Vitória, já veterana e cansada.

A hora do recreio era em separado.

As meninas primeiro, que se utilizavam da área perto do Moinho d'água, ali perto para suas necessidades, pois não havia privada, nem banheiro.

Os meninos, 15 minutos depois e usavam os barrancos e o córrego, aumentando o volume das águas...

Fiquei ali parado, um tempo que passou como um raio e durou uma eternidade.

Quando as saudades e as lembranças me deixaram, acordei como de um torpor e fui saindo de fininho, olhando para os lados e conferindo se alguém havia percebido minha intromissão naquele "santuário"...

... quando olhei para trás e bem lá nos fundos da construção, minha tia Vitória, a tia "Nezica", como a chamávamos, estava posando para uma foto com seus alunos (somente os meninos) onde ao centro, o Leopoldo segurava uma pedra, como que a apresentando à posteridade e do lado direito, com terninho de calças curtas, o Edir Butina, se destacavam dos colegas (havia chegado da Missa na Igreja da Glória, por isso ainda impecável nos trajes)

e ela, com os olhos melancólicos se despedia de mim, de minhas lembranças e minhas saudades...

parecia me abençoar, dizendo assim: - Vai em Paz, meu filho e conta para o povo do futuro de como era dificil e ao mesmo tempo gratificante o convívio respeitoso e afetuoso o clima entre alunos e professores nessa Escola Mista Rural São Vicente de Paulo, nos anos 40 nessa Juiz de Fora, Estado de Minas Gerais...Turma de 1951 provavelmente, com Tia Vitória Moreira Clemente e Dona Elza Menini com a turma mista de meninos e meninas posando para a posteridade.

Escola Mista Rural São Vicente de Paulo - Borboleta - Juiz de Fora -MG.

Vicente de Paulo Clemente