Infâncias
Quando tínhamos tempo e não possuíamos relógio. A propaganda não era alma do negócio
Éramos desbravadores da vida
O dia era curto
O dia era longo
A fogueira a noite era um pequeno ponto luminoso onde orbitavam imaginações afiadas
A criançada ficava calada ao som de velhas histórias com assombrações, anedotas
Nossos avós nos ensinava os valores da vida
Tudo ficava claro.
A mata era um reino a ser invadido
O tempo deglutido em glosa
Quando tínhamos pés de mangas pra subir e não escadas, o verde que queríamos era a mata inculta
Entrar na casa mal assombrada
Não sonhávamos em contrato
Gostávamos do contato
Abraços verdadeiros
O futebol na rua mostrava a face nua da felicidade
Movidos a simplicidade, campeonatos eram disputados com gana e fervor
Era um terror entrar em casa pra beber água e ter o retorno pra rua cerceado
Não se gastava muito com cadeado
A vida se passava em cercas e muros baixos
O reino era coletivo
O tempo passou...
Vieram os contratos
Os cadeados
As muralhas
Cercas elétricas
A rua virou campo minado
O campo virou condomínio
O domínio do egoísmo transforma minhas memórias em fósseis recentes de um mundo extinto
Quis o destino que eu me tornasse um saudosista
Tenho pena das novas gerações que ganham telas na tenra infância e com essa nova forma de abandono, não conseguem tragar o gosto bom de ser criança
Meninos e meninas com agenda cheia
Não colocam o pé na areia
Não comem fruta no pé
É triste saber que minha geração que foi tão bem vivenciada nas situações até aqui rabiscadas não se preocupa em deixar o legado do preparo
Crianças poupadas e alejadas
Mal acostumadas com o tudo ter
Quando a vida mostrar a real como o menino vai proceder?