A CERTIDÃO DE NASCIMENTO

“CASULO

De seu somente o corpo.

Invólucro. Materialidade

densa de palavra

imanente à Poesia.

Imagens vazando o sentir.

MONCKS, Joaquim. CONVERSA DE HOSPÍCIO. Obra inédita, 2024.”

É aconselhável que não nos iludamos, de imediato, com a expectativa de que alguma de nossas peças poéticas apresente algum laivo de beleza e qualificação e logre despertar sensação de acolhimento por parte do inominado receptor.

Depois da publicação, o poema não é mais nosso em seu viés e ninho emocionais, passando a ser do Outro, o eventual consumidor da sugestão em linguagem poética. Nos poetas-autores exsurgem a sensação de sucesso e os efeitos materiais inerentes aos direitos de autor e outras possíveis benesses autorais concernentes ao mundo das realidades.

O importante é que demos vaza ao conjunto verbal tendo em conta de que a nossa voz, este primor emocional de síntese, ritmo e palavra a quem o sábio Armindo Trevisan nomina como “a lucidez enternecida”.

Com a circulação do poema, aparecem novos interlocutores, mesmo que nem saibamos quem são e que estes anseiem pela possessão por inteiro da proposta que lhes possa trazer perspectivas individuadas de felicidade ou qualquer outro bem passível de prazer e gozo incomuns.

O poema é matéria viva: nunca saberemos por antecipação, como palavras e imagens irão se comportar no minuto seguinte ao do nascimento em estado de Poesia. Porque a inspiração avulta num átimo do fiat lux, uma centelha mínima a incandescer o emocional com promessas ou probabilidades da ocorrência de algo.

E a instabilidade provém da veraz (in)capacidade para vestir de Beleza o mundo dos fatos (sempre hostil) aos descuidados e/ou apressados de pensar, sentir e se indagar nos territórios da palavra. Trabalhemos. Bem, ao menos temos tentado agir e buscar dizer mais com menos palavras.

Síntese vocabular, ritmo, metaforização, imagética, conotação e conformação estética são vitais para a caracterização da Poesia em todo e qualquer espaço e temporalidade planetária, independentemente do idioma e da escola a que nos afiliemos.

É plausível esperar que, por irmos buscando, catando, cavoucando, identificando, depois de algum tempo e dedicação, num repente, entraremos em Estado de Poesia, dando de cara com a palavra mimetizada em imagens, adejando o seu universo de transfiguração.

Desta sorte, no mínimo, estaremos aptos a entender o Mistério, o único que realmente pode produzir, suscitar ou emitir Poesia, na singela inteireza de sua concretude ou materialidade.

No mais, eis o humilde arauto do mistério, sacralizado, colhido pelas sensações emocionais que o receptor joga sobre a peça bafejada pelos sentires do Outro, dando-lhe fortaleza e significação.

A seu tempo e compasso, a peça estética vai seguir caminho, instaurar-se como elemento de discussão educacional e aproveitamento dos fios de cidadania, também prontos para a condição de clava ou cajado a serviço da humanidade em sua ânsia de desvelar significantes e significados.

Algumas serão música aos olhos e ouvidos dos vulneráveis necessitados de harmonia e paz. Poderá até ser servida quando da cena dos escolhidos para a multiplicação do pão e do bom vinho propositor de íntimos afetos. E, mercê de doçura e temperança, sugerir a trégua entre os antagonistas de plantão.

MONCKS, Joaquim. A VERTENTE INSENSATA. Obra inédita em livro solo, 2017/24.

https://www.recantodasletras.com.br/escrivaninha/publicacoes/preview.php?idt=8122015