Lar de idosos XIX

E a mãe morreu.

Tem tanta história no meio...

Devagarinho a filha vai conseguir falar de tudo. Por enquanto... vamos ao que acabou de acontecer.

Tudo foi doado a um Asilo. A filha entrou em contato com o Asilo - que aceitou prontamente. Inclusive iriam até a Unidade onde estava tudo o que ficou lá... Entrou em contato com a administração da Clínica para saber se havia alguma regra específica para entrega sem a presença de alguém da família. Uma nuvem muito escura paira sobre esse Lar onde a mãe passou o que passou... a filha quer distância... muita distância.

Foi-lhe dito que a Clínica precisava de três dias para organizar tudo e que avisaria quando pudessem ser retirados os objetos e roupas. A filha avisou o Asilo e esperou...

A filha esperou...

Havia mais uma questão para resolver: ficou algum débito? A filha entra em contato com a administração, que irá entrar em contato com o financeiro. OK... a filha espera.

Daí, no dia em que a filha perguntou sobre o débito, a administração lembra de avisar que já está tudo OK na clínica, o Asilo pode ir buscar. Ué? A filha não seria avisada? Pois não foi... só quando entrou ela mesma em contato,,,

Recebeu ligação do Asilo - mas como estava resolvendo outras coisas importantes, a filha não atendeu.

Acabada a ligação, entrou em contato com o Asilo.

Sabe por que o Asilo estava ligando? Porque precisava saber o nome da idosa... da mãe no caso... como se a filha não tivesse ido mil vezes à clínica... não tivesse entrado em contato com a administração... não tivesse a clínica esperando alguém que fosse buscar os objetos da Dona Vera.

A pergunta é: mais pessoas estavam doando seus bens a um asilo? A relação do nome da filha com o da mãe foi esquecido em uma semana?

É tudo tão frio... é tanta insensibilidade... é tanto descaso... é tanta falta de competência... é tanta tristeza...

As densas e escuras nuvens se tornam mais densas e escuras. O coração da filha aperta no peito. um fio de navalha parece percorrer seu corpo. Era só um corpo o que estava na clínica? Nem seu nome mais é lembrado? Mãe e filha não tinham conexão nenhuma para cuidadores e enfermeiros?

Dez dias foram suficientes para as lembranças se esvaírem pra sempre. Será o hábito de conviver com idosos, que estão há um pé da morte, que torna esses profissionais tão insensíveis? A filha viu a desumanidade como a mãe e outros eram tratados... tentou resolver a situação da mãe... tentou... não conseguiu.

Hoje ela diria: não se torne um idoso. Não se torne um idoso que precise ser levado a uma clínica porque a família sozinha não dá conta de cuidar.

Ou...

Não se torne um proprietário de uma Clínica de Idosos se não tiver amor em seu coração... se não for humano o suficiente para ficar de olho em quem trabalha na sua clínica. Pense num número de cuidadores que deem conta - muito bem dada - em quem estiver sob seus cuidados. Humanize cada idoso de sua clínica. Faça isso... ou procure uma profissão em que nenhum ser humano precise de você. Não jogue no lixo sua energia de trabalho. Trabalhe com máquinas. Elas não têm coração.

Rosangela Calza
Enviado por Rosangela Calza em 02/08/2024
Reeditado em 02/08/2024
Código do texto: T8120367
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