É xingamento? Ou é coisa de comer?

 

 “O que é isso, menino? Tu estás me xingando? Ou isso é coisa de comer?”, disse-me pelo WhatsApp, tempos atrás, uma amiga lá de Belém. Estava brincando, claro. Sabia que eu, pelo respeito e carinho que tenho por ela, não a xingava na ocasião nem a xingaria jamais. Ela, contudo, realmente não conhecia a palavra que eu dissera e a que ela se referia. É que eu havia dito: “Deixa de ser lacônica.” E lacônica era comum apenas para mim, não para ela.

 

Ela, embora seja um doce de pessoa, é lacônica. Dialoga com monossílabos: “sim”, “não”, “foi”, “é”. E assim por diante. Isso, evidentemente, dá ao interlocutor, principalmente na comunicação por escrito, a impressão de aborrecimento. Assim é que, algumas vezes, até por brincadeira também, lhe pergunto: “Estás zangada comigo? Que foi que eu fiz?” E ela, obviamente, responde: “Não. Por quê?” E eu digo: “Ora, quase não estás respondendo. Só monossílabos. Pensei que estivesses zangada comigo.”

 

Nada que ver uma coisa com a outra, mas me lembrei-me disso ao ler as crônicas “Todos os seus odds a nu” e “No que isso vai dar”, de Ruy Castro. Como não sou chegado a ficar lendo sobre política (Maduros, Trumps e quejandos), acesso jornais como a Folha de S. Paulo e O Globo, por exemplo, só para ler as crônicas dos cronistas preferidos: Ruy Castro, Tati Bernardi, Martha Medeiros, José Sarney, Joaquim Ferreira dos Santos, e assim por diante. Raramente leio outras matérias.

 

Pois é. Veja bem. É muito mais de meia-noite. Comecei a escrever a crônica ouvindo “Sem Você”, de Zezé de Camargo e Luciano, música que me traz à lembrança um casal amigo, de muitos anos atrás, que se separou. Não sei dizer porque, mas sempre que ouço essa música, me lembro deles. Separaram-se muitos anos depois de casados e com filhos. Vá entender. Acho que sofri mais pela separação do que eles próprios. Coisas da vida. Agora, ouço “Medo da Chuva”, de Raul Seixas.

 

Eu sou assim mesmo. Falei da separação dos meus amigos na minha crônica “A cor do sangue, a cor da vida, a cor da paixão”, de 14 de novembro de 2009, e ainda guardo na mente a frase que à época recebi dela por e-mail. Cortou como lâmina afiada: “O casamento acabou e por isso cada um deu o rumo que quis dar para sua vida.” É a vida. Também a lacônica, embora loucamente apaixonada pelo marido, foi deixada por ele. Vá entender. “Os idiotas não têm tédio” (Anônimo). Ele, com certeza, é idiota. A música, como a fila anda, andou. Ouço agora “Maluco Beleza”. Acho melhor ir dormir.