desLEALDADE

Deslealdade dói tanto porque ela só pode vir de alguém em quem confiamos.

É curioso como a palavra lealdade é linda, e como a quebra dela vira um xingamento da qualidade mais vil. Os leais, a despeito do que parece, trabalham duro, pois não é fácil se manter leal. Não importa a relação, a lealdade nunca arreda o pé das conexões verdadeiras. Foi isso que eu sempre pensei. E para manter a lealdade com o outro é preciso ser leal primeiro consigo mesmo. Somente quem se importa e honra com os acordos que faz consigo é capaz de ser leal com o outro.

Quem é leal também não é ingênuo, a lealdade é coisa que se entrega a endereço certo, sem equívoco. Geralmente os outros sentimentos aceitam pagamentos diversos. O amor, por exemplo, aceita atenção as vezes em troca dele.

A carência, coitada, aceita qualquer coisa. O carinho é específico as vezes, mas ele é como a carência, aceita geral também. A dor tem semelhança com o carinho, a vezes no desespero ela aceita qualquer coisa, até ela perceber que é sempre muito específica. Já o medo tem um procedimento de rejeitar geral, rejeita tudo, tudo, tudo. Depois ele vai nessa pilha de rejeição e como quem não quer nada vai catando aquilo que ele bem quer. É frustrante porque tem coisa que ele deseja da pilha que já estragou, aí o que resta é ficar sem. Quase todo sentimento leva tempo, mas uma hora ou outra eles vão aceitando o que é oferecido. Pegam suas coisas cada um no seu tempo e no seu critério de seleção que pode ser único, específico ou sem critério algum.

O único sentimento que não aceita outro pagamento em troca dele é a lealdade. A qualidade de ser leal nunca sai de moda, porém de tempos em tempos fica tão em baixa que se pode jurar que ela sumiu. Apesar disso, de parecer que acabou ou que sumiu, ao longo da história da humanidade a lealdade sempre muito segura e dona de si só faz acordo preciso, milimétrico. É só observar que dá tragédia grega à destinos políticos, de mesa de bar até um quarto de hotel é sempre a lealdade quem dita se acabou ou não. Além de ditar tudo, a lealdade tem lá sua humildade, da mesa de bar mais derrubada até o palácio mais suntuoso ela nunca muda. E como é difícil se manter fixa e imutável quando a vida é praticamente constituída de mudanças, a vida é totalmente instável...doidivana... ordinária...cruel...um deleite, uma maravilha, ela é até feliz,...e como é. A vida tem tudo, TUDO mesmo, e não para nunca, até parar. Nesse ínterim convivendo com tudo, a vida gosta mesmo é de lealdade. A vida requer amor, carinho, medo, todos esses ditos e outros mais, porém ela sabe que esses mudam, vem e vão. Já a lealdade nunca é confundida com nada. A lealdade é a lealdade, ela tem mesmo essa característica, dura, fixa, não muda, por isso que até quando alguém quebra a lealdade a língua precisou mantê-la alí, e acrescentou um prefixo (DES)LEALDADE) quase que pra mostrar e deixar claro que quem foi desLEAL não pode esquecer nunca, e nem vai. Até em quem não a deseja ela resta, imutável, com esse prefixo que fica com a responsabilidade da carga semântica de dizer da cretinice de alguém, mas sem o poder real de mudá-la.

(Quando eu desfiz uma amizade depois de adulta)

SouMinha
Enviado por SouMinha em 27/07/2024
Código do texto: T8115730
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