Torquato Neto

Nem só de sinais vive o homem.

É estranho isso. De uns dias para cá, fiquei interessado na vida e morte de poetas que se foram muito cedo. Eles perderam suas vidas escrevendo livros e registrando o que é belo. Procuro saber sobre suas biografias antes de ler os seus poemas. Quero entender como viveram e começaram a escrever. Essa estratégica me ajuda a compreender os seus escritos e comportamento para com as outras pessoas.

A geração intitulada "Mal do Século", tinha como temas principais a morte, o amor não correspondido, o tédio, a insatisfação e o pessimismo. Em 1853, o Brasil teve a primeira publicação dessa fase, com a poesia de Álvares de Azevedo. Porém, o grande problema do século XX foi a depressão, que ainda persiste até os dias de hoje.

Um fragmento de um poema dessa geração de Álvares de Azevedo.

"Que me resta, meu Deus? Morra comigo

A estrela de meus cândidos amores,

Já não vejo no meu peito morto

Um punhado sequer de murchas flores!"

Uma estrofe de sentimentos pessimistas, de desgosto e derrota revela uma alma apática. Entregue à tristeza e a um amor não correspondido.

Navegando pelas redes sociais, esbarrei no letrista, jornalista e poeta Torquato Neto. Acredito que ele teve uma grande influência da segunda geração romântica no Brasil. Como poeta, teve uma obra dispersa. Organizada postumamente. Nela não encontrei nenhum sinal de que ele pudesse ser um suicida convicto. Porém, na realidade, tentou se matar por quatro vezes. Alcoólatra, de temperamento difícil, teve várias crises emocionais. Foi internado oito vezes em hospitais psiquiátricos, incluindo o Hospital de Engenho de Dentro, de Nise da Silveira.

Era filho único de um promotor de Teresina, estudou no Colégio Marista de Salvador. Teve uma infância privilegiada. Isso não ocorreu com outros poetas da década de 1920 que se mataram prematuramente. Pessoas que tiveram problemas com seus familiares, de todos os tipos.

Torquato Neto conviveu com Caetano Veloso, Gilberto Gil, Tom Zé e José Carlos Capinam, no Teatro Vila Velha. Quando foi para São Paulo, trabalhou em parcerias com grupos de vários festivais, durante os quais criaram o Tropicalismo. Movimento brasileiro que mudou a nossa cultura.

Em uma entrevista, Nana Caymmi, referindo-se a uma das tentativas de suicídio do poeta, disse: "Pra mim, ficou claro que era uma paixão pelo Caetano. Todos ali falavam disso". Caetano, em outra entrevista, afirmou: "Se você me perguntar se nós éramos namorados, amantes ou coisa assim, eu posso garantir: não!"

Aos 28 anos, no dia do seu aniversário, após conversar com sua ex-mulher Ana Maria Silva de Araújo Duarte, trancou-se no banheiro, vedou porta e janela com lençóis, abriu o gás do chuveiro e se matou asfixiado.

Seu último poema:

FICO

"FICO. Não consigo acompanhar a marcha do

progresso de minha mulher ou sou uma grande múmia que só pensa em múmias

mesmo vivas e lindas feito a minha mulher na sua louca disparada para o

progresso. Tenho saudades como os cariocas do tempo em que eu me sentia e achava

que era um guia de cegos. Depois começaram a ver e enquanto me contorcia de

dores o cacho de banana caía. De modo q FICO sossegado por aqui mesmo enquanto

dure. Ana é uma SANTA de véu e grinalda com um palhaço empacotado ao lado.

Não acredito em amor de múmias e é por isso que eu FICO e vou ficando por

causa de este amor. Pra mim chega! Vocês aí, peço o favor de não sacudirem

demais o Thiago. Ele pode acordar.".

Gosto de ler e saber mais sobre os poetas suicidas. São leituras densas e interessantes. É um despertar para outra vida, outra maneira de ver as coisas dentro de nós e como elas se tornam poemas imaginários que jamais serão lidos ou criticados.

__ Ah! Posso ser um louco se você me permitir ser o primeiro da fila.

... E viva a poesia!!!

Pedro Cardoso DF
Enviado por Pedro Cardoso DF em 26/07/2024
Reeditado em 26/07/2024
Código do texto: T8115006
Classificação de conteúdo: seguro