Enxofre
De manhã fiz uma pasta com o sabonete de enxofre e passei nos cabelos. Tenho dermatite e me lembrei que usava um shampoo com o cheiro fortíssimo de enxofre para melhorar a caspa. Nisso, lembrei-me do dia que foi num médico e depois em outra clínica e o mesmo médico me atendeu. Lembro que falei baixinho pra minha mãe: "É o mesmo médico" e ela se levantou e falou: "Ah então quero meu dinheiro de volta". Eu era criança e insegura mas sempre tive essa sensação que sou o imprevisto mais caro e mais triste que minha mãe teve. Talvez por eu ser menina e ela ter perdido fatalmente um irmão mais velho num assassinato e seu pai (meu avô) ter sido um homem ruim, a distorção dela de que homens são melhores ou mais importantes que mulheres fique bem arraigado. Ou ela era somente econômica. Não sei.
O que sei é que nunca me sinto de fato suficiente nesse mundo. Não me levem a mal mas parece que desde de sempre nunca nada que faço é de fato bom. Fui a criança que me taxavam de mimada, suja, porca e talvez eu fosse isso mesmo mas mesmo mudando, crescendo... No fundo, nada mudou.
Ainda me sinto frágil como no dia daquele consultório. Ainda me sinto estranha, como se tivesse uma doença incurável e feia.
Dermatite seborréica é bem comum mas uns 25 anos atrás uma criança de oito anos no corpo de uma de doze, era demais pra sociedade.
Hoje sigo páginas de mulheres gordas, com síndrome do ovário policístico, com cabelos crespos e vejo que é normal ser gente. Ser humano, ter pele e sangue, gordura, perrengue.
Sou muito grata por tudo que tenho e até muita sorte por algumas coisas mas de vez em quando vem esse bichinho da insuficiência, da desistência, do ressentimento e todos eles fazem uma ciranda na minha cabeça e seu suor desse ao meu coração e sangra de dor. Eu sei, sou dramática pra burro.
Já perdi tantos amigos, to tentando me redimir mas não consigo.
Daqui a pouco o mundo acaba. Que bom.