Aos Meus Amigos

Éramos três. Eu, Joana e Carlos. Sabíamos que dali pra frente não restaria muito tempo para nos divertir. Joana amava Carlos e eu era totalmente apaixonado por Joana, que me segredava sobre suas aventuras amorosas ao lado de Carlos. Morávamos perto, às vezes dava para ver daqui Joana trocar de roupa, mas também conseguia observar as namoradas que chegavam à casa do Carlos, que Joana fingia ignorar. Não estudava com Joana e nem com Carlos, eles iam para a faculdade juntos, já que faziam o mesmo curso. O fim de semana era reservado para nós três, saíamos para diversos lugares e eu tentava separar os dois de toda maneira, Joana ficava diferente quando estava perto de Carlos, e ele nem percebia suas investidas.

Joana estava namorando Carlos, fazia três meses. Fiquei com ciúmes, mas resolvi não interferir no namoro, pois Carlos era meu melhor amigo. Com isso no final de semana ficava sozinho e às vezes vinham me visitar. Comecei a ler, com o tempo passei de Machado de Assis pra Nietzsche. Saía raramente de casa e o resto do dia ficava trancado na biblioteca que meu pai havia construído. Recebi uma carta de meus amigos, estavam me convidando para a sua festa de noivado. Resolvi ir para me convencer de que agora Joana não estaria mais ao meu alcance.

Champanha, talheres, uma mesa farta e vários convidados, Joana veio me receber à porta, estava com um vestido preto, por sinal muito feliz. Entrei e vi o Carlos que rapidamente me recebeu fervorosamente, sentei. Estava tão angustiado, que nem percebi quando o último convidado foi embora. Ficamos conversando a noite toda. Sentia-me enganado e traído pelos meus amigos, o ódio havia acabado com minha vida. Meu amor por Joana tinha se transformado em obsessão, meus amigos haviam se tornado para mim apenas colegas.

Passei de Nietzsche pra Drumonnd, meu fim de semana havia se tornado um tédio. Resolvi fazer uma visita aos meus amigos, troquei de roupa, peguei minha carteira e antes de ir passei em uma loja de roupas infantis, pois sabia que Joana estava grávida. Carlos me atendeu, percebi que me recebia por obrigação e não mais por amizade; convidou-me para entrar e perguntei sobre Joana. Carlos mudou logo de assunto e notei que não queria me responder. Voltei a indagá-lo e com uma brusca mudança em sua voz disse que eles haviam se separado fazia um ano, pois ela não mais o amava. Perguntei quem era a outra pessoa e percebi uma lágrima. Disse secamente que a outra pessoa era eu. Fiquei com um misto de felicidade e de tristeza, já que, mesmo sem saber fui à causa da separação dos dois. Logo me despedi.

Carlos suicidou-se com um tiro de arma de fogo na cabeça uma semana depois da minha visita. Joana sofreu aborto espontâneo e hoje é casada com um outro homem de aparência enrugada. Não fui visitá-la, talvez estivesse com medo de me declarar para ela. A roupa que havia comprado para seu bebê, na última vez que vi Carlos estava guardada. Hoje, leio Nietzsche, Drumonnd e Machado de Assis. No fim de semana saio para me divertir e de vez em quando relembro como éramos felizes.