Das coisas invisíveis.
Estou cansado, sonolento. Eu a vi hoje, trocamos palavras vazias.
Há um momento, e eu não sei dizer quando acontece, mas é quando toda aquela luz solar de amor que engolimos e emanamos, se deposita no fundo, escorre como um sangue velho, seco.
Ele me diz que há várias torras diferentes, grãos... toda uma miríade de coisas que me confundem um pouco a cabeça. Move as mãos com destreza. Julgo que já deve ter repetido aqueles movimentos, no mínimo, umas 20.000 vezes. Me diz que vou sentir notas adocicadas, cana de açúcar e não sei o que mais. Traz as ferramentas de alquimista, vejo a coisa fazer-se na minha frente, os vapores subirem, o líquido escuro pouco a pouco se formar e então eu bebo. Bebo, e tem gosto de ferrugem.
Seu vestido, eu lembro, era amarelo. Lindo. Vou voando. O corpo de metal me leva inerte, rápido. É bem difícil escrever aos sobe desces. Minha caneta vacila, os sacolejos me forçam a acalmar os pensamentos, ordená-los uma palavra por vez, assim como o café lentamente coado, como se o ofício do cronista fosse agora o mesmo de quem realiza um parto, de quem espera o tempo das coisas, espera pra poder seguir.
Andei pensando sobre a memória, sobre como é impossível demonstrá-la, provar que existe.
Palavras no tempo passado até se atrevem, tentam; "Eu fiz", "Eu vi", mas mesmo as mais precisas escapam, são a reprodução sistemática das coisas, das imagens, esses fantasmas que organizamos em sons e frases. Barthes diz que tem um pouco de fascismo na língua.
Vejo seu vestido amarelo se afastar. Há poucos segundos ele foi brilho vivo, claridade, mas agora se enterra em minha retina, me arrepia os lugares mais proibidos.