TIDINHA, A MARISQUEIRA
Ao primeiro canto do galo lá estava ela debruçada sobre o fogão de lenha a ultimar o providencial cuscuz com café que seria o alimento de todos até a volta da empreitada. Aos poucos iam todos levantando e lavando o rosto com água fria para despertar. Em seguida sentavam a mesa para a refeição matinal. Ainda tudo escuro, tanto que os mouchos emitiam os derradeiros agouros da madrugada antes do amanhecer.
Todos alimentados, liderados pela matriarca, filhos e filhas, irmãs de Tidinha e os seus punham-se em silenciosa caminhada empunhando baldes, bacias, peneiras e demais utensílios necessários a catada dos mariscos nas areias enlameadas da baixa da maré.
O mar ainda recuava lentamente e o dia ainda nem havia raiado. Todos esperavam pacientemente a baixamar que deixaria descoberta aquela faixa de mangue onde seria possível a exaustiva e complexa tarefa de revólver a areia e a lama em busca e esperança de conseguir colher a maior quantidade de mariscos.
Chegada a hora todos começavam a escavucar a lama. Enquanto as crianças brincavam em sua inocência sutil os mais velhos buscavam em frenesi naquela tarefa o sustento, quer financeiro, ou alimentar, posto que sem outra alternativa de trabalho que possibilidasse um ganho, aquela era a bênção de Deus que lhes permitia um sopro de vida a cada dia.
Passadas as horas e finalmente a água do mar movia-se lentamente dando sinais que em breve não haveria mais faixa de areia a descoberto tendo o mar retomado tudo novamente em seu constante ciclo de encher e vazar. Era hora de voltar para casa.
Juntadas as crianças e utensílios utilizados na catada de mariscos. Os adultos e adolescentes conduziam baldes cheios de mariscos e crustáceos catados na praia e no mangue. Chegando em casa começava a segunda parte do exaustivo trabalho. Era hora de juntar lenha e fazer fogo para esquentar água e ferver o marisco. Após aferventado todos se punham a separar o mariscos das cascas em um trabalho paciente. Tempo depois aquela imensa quantidade resultava em grande quantidade de casca e o marisco em si já limpo não passava de uma pequena quantidade que na maioria das vezes virava o próprio alimento da família ou em algumas ocasiões vendida a vizinhos ou apreciadores de mariscos e o pouco dinheiro arrecadado se revertia em compra de itens de subsistência como feijão, açúcar, arroz ou outras necessidades. Assim, de preamar em preamar Tidinha conseguia manter sua família com limitações, mas com dignidade e honestidade na encantadora cidade de Salinas da Margarida no recôncavo baiano.