Melodia
No Táxi, a caminho da Terapia, ainda sob o álcool e o cansaço da madrugada, leio que Luiz Melodia morreu. Automaticamente, pergunto ao taxista se ele, que escutava Rádio naquela hora, tinha escutado a Notícia. Ele me responde com um "quem?!", entre indiferente e espantado.
Me dei conta, uma vez mais, que Melodia é exceção. Poesia é exceção. A regra é um narcisismo que sequer conhece o Ego. A regra é um hedonismo que se ressente do prazer profundo. De que vale um cantor/compositor que fale de sentimentos fundos? De que vale meu ranço matinal à superficialidade e à morte da experiência?
De que valia, afinal, insistir em ir à Terapia com a cabeça cheia da madrugada passada?
Valia vomitar a madrugada passada. Valia remexer as vísceras e os sentimentos. Valia o esforço de entender, além do álcool, o que embriaga.
Por me distrair pensando em que, afinal, o Amor é mais permissão do que captura, que o coração só sente o que a razão consente - às vezes, para se salvar -, perdi um ônibus. E, conscientemente, tomei outro, o errado... para arrodear a cidade enquanto eu me encontrava recosturando os sentidos de ontem, da madrugada, de sempre.
Sentidos de Melodia.
No rádio do ônibus, brega da década de oitenta, me transportava por qualquer lugar mais longe do que Casa Amarela - até chegar ao Centro uma hora depois. "Quero você", ou nem sei se quero. Mas "saber" é um tanto presunçoso quando o desejo nos move.
No restaurante, dispersa como ontem, me entrego ao devaneio. Me comovo, indisfarçavelmente me comovo. Choro no canto do olho enquanto rio: os versos e canções de Luiz Melodia que me apresentavam os amigos e amigas naquele dia me dilataram o coração, mudaram sua pulsação.
Agradeço à vida pelo excesso, pela Poesia. Pela força fundadora, movente, de Melodias.