A CIDADE DAS MURIÇOCAS VAMPIRAS

Numa noite dessas na minha cidade, sonhei que estava sendo carregado pelas muriçocas. No sonho, vi meu próprio corpo sendo levitado sobre o leito. E logo depois fui conduzido, por milhares desses insetos hematófagos, rumo ao pé da serra.

Lá, no meio da mata, um grande comício de muriçocas já estava em andamento e um carismático muriçoco, sentado em seu trono de ferrões derretidos, discursava sobre palanque para a sua plateia eufórica. Mosquitos interpretes logo correram aos meus ouvidos, para traduzirem as palavras daquele que seria o seu mestre.

Entre vários zumbidos irritadiços e infindáveis, pude compreender que o comício se tratava de um concilio de guerra, que segundo o grande rei arauto das vontades de sua espécie, se justificava por causa da catástrofe terrível que estava acontecendo, e que a sociedade das Muriçocas Pretas e Pequenas MPP, tinha que lutar de todas as formas para combater as suas pavorosas inimigas, as Muriçocas Marrons Grandes MMG, cujo território era lá no tenebroso “outro lado do rio”.

Entre outras exaltações, muriçoquitas menores e sem muita expressão, também zumbizavam em voz altiva, que outros insetos hematófagos também representavam uma tremenda ameaça... Monstruosidades como os Pernilongos, os Borrachudos e os diabólicos Aedes-aegyptis estavam avançando perigosamente sobre os seus territórios. Sim, seus territórios, pois à ordem das Muriçocas Pretas e Pequenas, nunca sugava ninguém da periferia... Não! Jamais... Politicamente corretas, elas diziam atravessar bairros inteiros para chuparem seletivamente, apenas o sangue farto dos moradores do centro da cidade. Pois é...

Olhando ao redor, vi que também estavam lá naquele ato os Percevejos Barbeiros, que sempre foram tradicionais aliados das Pretas e Pequenas. E quando já não se via quase nada de ordem, mas apenas palavras de ordem, do tipo:– QUEM NUM TÁ CUM NOIS, TÁ CONTRA NOIS! – Aí então ... repentinamente, um zum-zum-zum se generalizou, e foi nesse exato momento, que a luz da lua foi encoberta por uma nuvem de morcegos cuspidores fogo. Sim, eles invadiram os céus! – QUEIMEM, QUEIMEM TUDO! – Bradava O Grande Muriçoco do seu palanque. E todas as muriçocas agora riam de mim com facas nos dentes! Tive ali a certeza absoluta que a cidade pertencia às muriçocas, e que as pessoas haviam se tornado “criações de corte” para alimenta-las! E em breve, ninguém mais teria nenhuma gota de sangue nas veias (exceto talvez as baratas)! E nisso tudo, o calor e o cheiro de enxofre já se tornavam insuportáveis!

E foi então que cai desmaiado no sonho, para redespertar para a realidade estapeando meu próprio rosto... aceitando assim, que realmente não dá pra dormir direito, vivendo dentro do ninho das Muriçocas Vampiras.