A minha avó usou uma roupa branca quando ficou viúva.
No velório, mesmo pequena, eu percebia um zumzumzum raivoso, algumas pessoas olhando para ela com uma certa crítica. O tom preto era regra, sinal de respeito em detalhe do sentimento, uma bandeira de sobriedade. Mas para a minha avó, o branco era como um beijo enternecido de paixão. Eu não fui à sombra pesada junto com as demais senhoras. Mas ficava, demorada ao lado da minha avó, que parecia brilhar amanhecida com o seu amor entreaberto feito uma flor. Não caminhava com o seu corpo arcado e oceanos nos olhos. Pairava, solitária sim, entristecida pela companhia de uma vida que se foi, mas alheia às normas e demais pessoas que a condenavam com suas línguas salgadas.
A voz murmurante dela e sua mão entrelaçada na minha, eu me lembro, e dos seus passos feito brisas, ela flutuava ainda que triste. Não tinha uma exaustão infinda na fala. Parecia um veleiro de velas brancas, uma porção de água sóbria diante de sua parte que se foi.
Ela sabia que tradições são coisas aprendidas e nada mais! E não se importava com as críticas. Era uma pensadora, uma revolucionária não barrada pelo julgamento nem o estranhamento dos demais. Transitava livre entre a ignorância dos polarizados.