No Meio do Caminho

 

 

Sentindo saudades do ínclito poeta e conterrâneo Carlos Drummond de Andrade, abri o livro, para relendo-o, amenizar as saudades sentidas. O poema escolhido fora este que dá nome a esta crônica de crônicas saudades: No Meio do Caminho. Repito-o:

 

No Meio do Caminho

                                                                           (Carlos Drummond de Andrade)

 

No meio do caminho tinha uma pedra

tinha uma pedra no meio do caminho

tinha uma pedra

no meio do caminho tinha uma pedra.

 

Nunca me esquecerei desse acontecimento

na vida de minhas retinas tão fatigadas.

Nunca me esquecerei que no meio do caminho

tinha uma pedra

tinha uma pedra no meio do caminho

no meio do caminho tinha uma pedra.

                    ~~*~~

À época, os doutos criticaram pela sua simplicidade e repetição do texto. Com o passar dos tempos, os versos foram sendo compreendidos pelo público e pela crítica. Certa feita, uma repórter ao entrevistar o poeta perguntou-lhe:

-O que o senhor quis dizer com este poema? – indagou!

-Nada! Somente quis dizer que havia uma pedra no meu caminho! – nada mais que isso. Respondera-lhe o poeta!

 

Esta resposta dada à jornalista, pela sua simplicidade, fizera – por certo – calar toda a crítica aludida ao poema. Atualmente, o poema é uma espécie de Cartão Postal da obra de Carlos Drummond de Andrade.

Mortas as saudades sentidas pelo poeta maior, volvo à realidade. E lá vou eu pelos caminhos da vida. Em dado momento, eis que deparo haver no caminho onde trilho um enorme buraco. Dele, egoisticamente contorno-o. Temia cair nele.

 

As estradas das nossas vidas não são pavimentadas e nem são estradas de terra batida, paralelepípedos ou asfaltos. São vias construídas com papel carbono, onde nelas depositamos todas as nossas marcas/ações nas passagens por esta pequena fase das nossas vidas, neste efêmero átimo temporal terreno. Tudo aquilo que fizermos ou viermos fazer, ficarão registrados no papel carbono que pavimenta a estrada das nossas vidas.

 

Ao deparar-me com o buraco no caminho por onde passava, contornei o perigo e resoluto segui em frente. Será que fiz o correto contornando o buraco? Será que o mais correto não seria o ato de despir-me do meu egocêntrico pensar, tampar o buraco ou, no mínimo, nele colocar um aviso de perigo iminente? Lamento o meu egocêntrico pensar e agir por não me preocupar com o próximo que por ali iria passar.

 

Devo esclarecer: -Não há nesta modesta crônica – de crônica e triste realidade – uma crítica ao poetinha maior, ‘por não ter retirado a pedra que havia no seu caminho’. Eu, também, não tampei o buraco que havia no meu caminho e também, sequer, pensei no meu próximo que, inadvertido no seu caminhar, não havia percebido o perigoso buraco no caminho no qual trilhava e nele veio acidentar-se.

 

Se nos preocupássemos mais com o nosso próximo, o mundo seria melhor. Se ao vermos a dificuldade de um portador do Mal de Alzheimer ao sorver um copo d’água e com este triste fato viesse a nos incomodar ao ponto de lhe socorrer, o mundo seria muito melhor. Se nos preocupássemos com um cego tentando se alimentar num restaurante, sem conseguir, e dele, com o fito de lhe ajudar, nos aproximássemos para auxiliá-lo, o mundo seria muito melhor!

 

A Pedra do Caminho de Drummond e o Buraco no Caminho de todos nós nunca deixarão de existir, todavia cabe a todos nós (como, também, coubera ao poeta Drummond) retirar do caminho a pedra que nele ficou, assim como os buracos nos quais o nosso próximo pode, neles, se acidentar e que o egocêntrico nosso pensar não nos permitiu tampar.

 

Tampemos, pois, os buracos que há nos nossos caminhos! Retiremos todas as pedras que possam surgir em nossos caminhos. Creiam: O Mundo Será Muito Melhor!

 

No Meio do Caminho

                                         (Altamiro Fernandes da Cruz)

 

No meio do caminho tinha um buraco (Não o tampei.)

tinha um buraco no meio do caminho (Aberto o deixei.)

tinha um buraco (E ainda tem! E que tenho eu com isso?)

no meio do caminho tinha um buraco. (E continua tendo.)

 

Nunca me esquecerei desse acontecimento (Será que não?)

na vida de minhas retinas tão fatigadas. (Por ser egoísta confesso.)

Nunca me esquecerei que no meio do caminho (Já me esqueci que)

tinha um buraco (E sem me importar com o próximo – dele me desviei.)

tinha um buraco no meio do caminho (Sem pensar no outro, não o tampei.)

no meio do caminho tinha um buraco. (E lá permanecerá! E daí meu????)

~~*~~

Imagem: Google

Altamiro Fernandes da Cruz
Enviado por Altamiro Fernandes da Cruz em 27/06/2024
Reeditado em 27/06/2024
Código do texto: T8095241
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