O fim da farsa sobre as “coações” da Lava Jato

Empreiteiras conseguiram o que queriam, condições melhores para pagar suas multas. Chega de dizer que houve algo errado nos acordos de leniência

Não houve coação nos acordos de leniência da Lava Jato. Não se trata de uma opinião, mas de um fato objetivamente admitido pelas empreiteiras no processo de renegociação das multas e ressarcimentos que elas se comprometeram a pagar anos atrás, ao assinar as leniências.

Se fosse questão de princípio ou justiça provar que, durantes as investigações do petrolão, elas foram forçadas a assumir crimes que não haviam cometido, as empresas que participaram das tratativas nos últimos quatro meses – Novonor (ex-Odebrecht), Camargo Correa, Andrade Gutierrez, Nova Participações (antiga Engevix), Metha (antiga OAS) e UTC Engenharia – não teriam cedido.

Mas elas deixaram de insistir nessa tese logo no começo dos trabalhos, em fevereiro. Pois era, obviamente, apenas questão de dinheiro.

Nesta segunda-feira, 24, as empreiteiras concordaram com o principal mecanismo que estava em discussão: poderão utilizar 50% dos créditos tributários gerados em anos de prejuízo fiscal para pagar o que devem à União.

Elas ainda se esforçam para incluir nessa conta também o que devem à Petrobras. Se conseguirem, poderão abater 5,9 bilhões de reais por meio dos créditos. Se não conseguirem, devolverão 4 bilhões de reais aos cofres públicos dessa maneira e terão de se virar para ressarcir a petroleira em dinheiro mesmo.

- Prejuízo fiscal

Essa, sem dúvida alguma, é a solução correta. Ao contrário do que pensam Lula e o PT e do que fingem não saber os advogados das empresas, o caixa da Petrobras (que tem acionistas privados, lembram?) não se confunde com o da União. O cartel que barbarizou a petroleira não pode usar créditos fiscais para compensá-la.

- Crimes readmitidos

Mas voltemos ao ponto de partida. Durante a renegociação, as empreiteiras, em busca de um alívio nas condições de pagamento de suas dívidas, reconheceram mais uma vez o que já se sabia: houve corrupção na Petrobras; houve cartel que beneficiou empresas; houve desvio de dinheiro que beneficiou executivos, políticos, partidos, autoridades. Os crimes foram readmitidos. A Lava Jato não foi um delírio.

Com o fim desse processo, é preciso que haja consequências jurídicas. Depois que tanta gente se sentou na mesma sala iluminada – empresas, AGU, CGU e até um representante do STF, o ministro André Mendonça – reafirmou a existência do petrolão e chegou a uma nova combinação financeira, é preciso extinguir a ação que está na origem de tudo.

Trata-se daquela ação delirante, patrocinada por três legendas de esquerda (Psol, PCdoB e Solidariedade) e assinada Walfrido Warde, um integrante do grupo prerrogativas (aquela agremiação de advogados milionários também de esquerda), segundo a qual a Lava Jato criou um “estado de coisas inconstitucional” e submeteu as coitadinhas das empreiteiras, com seus exércitos de advogados caros, a torturas que nem a Idade Média chegou a sonhar.

O petrolão existiu, Dias Toffoli

O ministro André Mendonça deveria extinguir esse troço com palavras duras para os partidos de esquerda e algumas indiretas para os advogados milionários do grupo prerrogativas. Aliás, o fundador do grupo, Marco Aurélio de Carvalho, representou a Camargo Correa na renegociação. Nesta terça, ele disse ao Estadão que “ninguém saiu vencedor desse processo”, mas seu escritório deve ter ganhado alguma coisa, não é?

Logo em seguida, Mendonça deveria chamar o seu colega Dias Toffoli para um cafezinho e lhe dizer que pare de destruir a Lava Jato com canetadas solitárias. Porque veja bem, amigo Toffoli, ou melhor, amigo do amigo do pai do Marcelo Odebrecht, o petrolão existiu. Deixemos então de fingir que a Lava Jato foi a coisa ruim que aconteceu ao país. Horrorosa mesmo foi toda aquela corrupção.

Carlos Graieb

Carlos Graieb é jornalista formado em Direito, editor sênior do portal O Antagonista e da revista Crusoé. Atuou em veículos como Estadão e Veja. Foi secretário de comunicação do Estado de São Paulo (2017-2018). Cursa a pós-graduação em Filosofia do Direito, da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP).