Tio Benjamim Santiago
Tio Benjamim Santiago, meu tio-avô do lado materno, viajava de olhos fechados, ombros, braços e mãos adestradas ao som do seu violino. Aquilo me contagiava. Não sei se era bom violinista, eu devia ter uns cinco ou seis anos nessa época, não podia apostar na musicalidade de ninguém. O que posso dizer, com certeza, é que a família de meu avô materno é bastante afinada.
Tio Benjamim e seu violino para onde viajavam? Talvez às origens da família, no Caxingó, onde brincara com os irmãos nos córregos transparentes e nas matas ainda virgens do Oeste de Minas. Mas era no sobrado do Padre Belchior, paredes grossas, portas e janelas pesadas, na rua do mesmo nome, que a gente o encontrava para escutar sua música, histórias e brincadeiras . No sobrado, junho de 2024, situa-se a Prefeitura de Pitangui. O sobrado parece ter conservado o essencial de um prédio do Sec. XVIII. Benza Deus!!!
O tio gostava muito de brincar com as crianças, lhes dava apelidos engraçados e fazia rimas com eles. Em uma das brincadeiras, me chamou de William Cabeça e - dizem - eu respondi de bate-pronto: "Benjamim "cefereça". Não me perguntem o que quer dizer "cefereça", ainda não constava na época e ainda não consta do Aurélio. Tampouco o Google sabe disso.
Sua filha, Leninha, dava catecismo no porão do sobrado, sorteava santinhos e falava dos castigos dos Infernos. Nos questionários religiosos, eu nunca lhe daria resposta rimada, temia os desígnios divinos. Leninha, minha prima, que devia chamar-se Helena, fazia santinhos para presentear os catequizandos com corações brancos e corações pretos. Os brancos eram dos puros e os pretos eram dos maus, uns iam para o Céu e outros para o Inferno. Eu sempre recebi imaculados corações e nunca vi alguém receber os corações pintados de preto. Na certa, era só pra nos assustar,
Tio Benjamim morava e tinha farmácia naquele sobrado. Algum tempo depois, mudou seu comércio para uma das lojas do antigo Edifício Liliza, na rua do Pilar. Ali, por muitos anos, seu filho, o Zequinha, nosso primo, prosseguiu na profissão de seu pai e, depois, fechou a farmácia para abrir, no mesmo local, um bazar, tocado por sua filha Kátia.
Tio Benjamim faleceu enquanto eu morava fora de Pitangui, não sei quando. Tinha ligações com Ibitira, no município de Martinho Campos, terra de sua esposa. Ali residiu no final de sua vida, segundo informações dos parentes. Poucas, porém deliciosas recordações, guardei daquele homem bom e de seu violino, que nos levava ao Céu sob o comando daquelas mãos, braços e ombros musicais.